Denilson Bertolaia: Mestrando em Sistema Constitucional de Garantia de Direitos pelo Instituto Toledo de Ensino (ITE)
A desordem econômico-social brasileira é consequência de não se haver atingido a plena democratização da sociedade. Algumas vicissitudes sociais são frutos das ideias políticas e econômicas capitalistas contemporâneas, as quais defendem a não participação do Estado na economia, dando total liberdade de comércio. Os governos Reagan, Thatcher e Pinochet, com essas mesmas políticas capitalizadas, elevaram a taxa de desemprego, a desigualdade e a injustiça social. O Brasil, seguidor de igual caminho, ainda não encontrou o equilíbrio do ideal democrático fundamentado no “valor igualdade”, em razão da existente desigualdade econômica (abismo entre os que têm e os que não têm), da desigualdade política (políticas que privilegiam setores com força política) e da desigualdade filosófica (vício de buscar privilégios em vez de direito, ou o próximo).
Não é possível falar em regime político sem refletir sobre o “valor liberdade”, que tem origem no período medieval, sob o termo “freiheit” (liberdade em alemão). Assim, a noção de liberdade vem de um contexto em que os escravos usavam um grilhão no pescoço, simbolizando a limitação e a obediência, enquanto os seus respectivos senhores, sustentados pelo gozo da liberdade plena, não o utilizavam. Nessa linha, René Descartes, filósofo e matemático francês, afirma que o próprio conhecimento se equipara à liberdade, uma vez instituído o livre-arbítrio como sinônimo de liberdade. Por meio de seu cogito cartesiano, proferiu a célebre frase: “Penso, logo existo”. O livre-arbítrio dá, ao homem, árbitro de si mesmo, a perspectiva de autonomia, e, dessa forma, ele pode manipular o mundo dos objetos, transformando-os.
Portanto, igualdade e liberdade são pressupostos para constituir a democracia, da qual nasce a função estatal legiferante. Essa função, de acordo com a filosofia do direito, obedece predominantemente a interesses econômicos e não a interesses morais e éticos. Desta forma, vai crescendo o desajuste entre lei e realidade, consequentemente induzindo a interpretação das leis num sentido mais de cunho técnico que justo. Nesse contexto, fortalece-se o positivismo jurídico, corrente que trata das normas postas pelas autoridades que possuem o poder político constituído, descomprometido com a ética, a moral e a evolução social. Já no campo dos direitos humanos, verifica-se que, no transcurso dos séculos, passando, por exemplo, pelo período da escravidão e da inferioridade da mulher, prevaleceu o direito imposto pelo poder e não pela consciência social. Nessa seara, o inglês Hebert Hart, filósofo do direito, afirma que as normas subordinadas de um sistema positivista podem ser válidas e existir mesmo que sejam desrespeitadas.
Por fim, surgiu a codificação das leis como instrumento para controlar as massas, orientando-as, leis estas que foram impostas por escrito pelo sistema burguês capitalista. Numa análise mais aprofundada das fontes do direito, mostra que elas são formatadas exclusivamente com base no poder constituído e não na consciência social. Portanto, a relação entre moral e direito é marcada por uma luta constante, na qual os valores morais e éticos estão sempre em conflito com o direito positivado.