Numa estupenda luta de boxe um grande número de infrações é proibido. Nas próprias regras do embate isso é muito claro, embora seja inevitável que elas não aconteçam. Por isso que esse encontro impetuoso é recheado de punições. O árbitro da luta é quem define e pune o infrator. Os lutadores sempre procuram cometer faltas e tentam escondê-las para que o juiz da luta não perceba ou pelo menos não as veja. Quando uma falta é reclamada por quem a sofreu, imediatamente o adversário meneia a cabeça querendo deixar claro que nada cometeu, aguardando não ser injustamente punido. Assim como num jogo de futebol os infratores levantam as mãos tentando provar que não cometeram nenhuma irregularidade. Mas quando o juiz interrompe a luta e se manifesta que a infração aconteceu, o infrator acaba por aceitar e até mesmo a pedir desculpas.
Numa nação devidamente constituída os crimes são inaceitáveis, mas nem assim deixam de existir. As leis são elaboradas para salvaguardar os direitos dos que sofrem a irregularidade, mas são as próprias leis que acabam por afirmar que as imprudências são inevitáveis. Caso não fossem, nem seria necessário existir a legislação punitiva. O boxe convive tranquilamente com a prática das penalidades parecendo até que em cada uma das lutas as faltas fazem parte da emoção do jogo. Em proporcionalidade não diferente, a sociedade aprendeu a conviver com os crimes que nela são praticados, uns até, de tanta criatividade, chegam a fazer parte dos enredos cinematográficos. Os crimes mais ‘aceitos e engolidos’ pelas sociedades são motivados por razões levianas das pessoas, tais como passionalidade, riquezas e cobiça, poder, domínio e até por um número infinito de futilidades inaceitáveis. Nos crimes ‘aceitos’ pela sociedade nem sempre ou dificilmente vidas são ceifadas, mas creio que não vai demorar muito a aceitação dessa regra. Tão logo os crimes acontecem uma gama de pessoas se envolve em seu desfecho até que a penalidade seja ou não determinada. Entram aí advogados, juízes, promotores, delegados e outros coadjuvantes agindo cada qual com sua especialidade, até que a sociedade acabe por aceitar o arquivamento ou a punição.
Imaginemos uma situação de luta em que o árbitro do embate acena uma falta grave e o infrator não lhe dá ouvidos, portando-se como se nada cometera. Continua o combate normalmente. O adversário, sofredor da falta, ao sentir-se prejudicado, revida da mesma forma a penalidade sofrida. O juiz, com mais severidade, tenta impedir que a luta prossiga e novamente não é atendido. Um dos lutadores fica exposto à lona com sangramentos e totalmente desacordado. O que fez o vencedor? Deixou claro que não aceitou as regras determinadas pelo árbitro e por isso não parou a luta. Na batalha, ele não tentou iludir o juiz escondendo atitudes, simplesmente não aceitou as regras do jogo. Sendo ele o mais resistente, praticamente determinou que ‘vai ser assim e pronto’.
Um criminoso isolado, pouco significa à sociedade em que vive. Mas se os criminosos aumentarem gradativamente acabarão se organizando em grandes quadrilhas corporativas e determinarão, a partir daí, como deve viver a sociedade que criaram. Consequentemente, seus crimes passarão a ser a regra normal do jogo e, portanto não passíveis de punição. Parece que esse quadro é uma mera coincidência com a sociedade que estamos constituindo. Lares são invadidos, prédios são saqueados, pessoas são abatidas nas ruas como se estivessem invadindo áreas privativas de uma sociedade fabricada por ideologia política. Está nos parecendo que essa foi a regra implantada e por isso os culpados não serão punidos. Estamos vivendo a era do medo. Adultos sem rumo, crianças sem perspectivas de futuro. A sociedade constituída nesses moldes não se preocupa com educação, saúde e segurança (a não ser a dela). Resta-nos torcer para que alguma luz acenda e de uma vez por toda ilumine as atitudes dos novos dirigentes da nação brasileira. Que possam desempenhar suas funções públicas com dignidade e responsabilidade, cumprindo e fazendo-se cumprir normas e leis, peculiaridades de uma democracia sonhada pela maioria dos brasileiros.
Professor MSc. Manuel Ruiz Filho - manuel-ruiz@uol.com.br - Votuporanga
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