O que serve de base para a avaliação do desempenho de Lula e Dilma é a votação no primeiro turno. Considerando que a dupla só teve 42,85% dos votos no dia 3/10, mesmo com a utilização descarada da máquina estatal, conclui-se que o governo Lula não tem a aprovação que tanto alardeia. Essas pesquisas sobre índice de aprovação do governo nunca me convenceram. Os votos nulos e em branco não podem ser deixados de lado, pois revelam desaprovação a todos os candidatos. No segundo turno, Lula e Dilma tiveram 52,3% dos votos, considerados os nulos e em branco. Ou seja, dos eleitores que foram às urnas manifestar sua vontade, praticamente a metade desaprovou a situação. Povo “allegro ma non troppo”. E o pior é que a pequena diferença a favor da candidata oficial só foi obtida em grande parte devido à incompetência do partido rival. Em Minas Gerais, governada pelo PSDB nos últimos oito anos, Dilma teve quase 18% de votos a mais do que Serra. Em São Paulo, reduto do PSDB, Serra ganhou, mas com meros 8% de vantagem. Povo satisfeito, “pero no mucho”. Ou seja, a eleição foi perdida por Serra porque nos dois maiores colégios eleitorais do país, onde o PSDB tem o poder, sua votação foi baixa. Fica evidente que, se a situação não é das melhores, a oposição parece não ter coisa melhor a oferecer. Triste retrato de um país em que o pluripartidarismo só existe no papel.
Por que Serra não fez uma diferença maior em São Paulo? Simples. Em áreas afetas ao poder estatal, como a saúde, a segurança pública e a educação, o estado deixa a desejar. A Polícia Civil está sucateada. Conheçam a Delegacia de Defesa da Mulher de Piracicaba, uma cidade pujante da região mais rica do país, e vejam a que me refiro. A Polícia Militar tem um contingente muito menor do que o necessário. Os salários estão defasados. Votos que poderiam ir para Serra foram para Dilma, não porque os eleitores gostam mais dela, mas porque quiseram demonstrar insatisfação com ele. Grande parte do funcionalismo público estadual vestiu a camisa de Dilma como forma de protesto. São Paulo possui a melhor malha viária do país, e isso o PSDB costuma usar como trunfo, mas o preço que se paga para rodar pelas rodovias estaduais é indecentemente alto. Aliás, o custo de vida no estado é alto. Somem-se a isso denúncias de irregularidades em obras do rodoanel e do metrô...
Dilma elegeu-se. Que esperar do seu governo? Mais tributos. A CPMF, ou CSS, está a caminho. Ela não tocou no assunto na campanha, ficava o tempo todo falando da riqueza que virá com o pré-sal. Ora, se temos esse “bilhete premiado”, como ela diz, porque mais tributos? Óbvio: é mais do mesmo, é a cultura governamental do estado glutão, sustentado por quem trabalha. Por conta dos gastos desmedidos do governo, as contas públicas vêm apresentando seguidos déficits mensais. Em setembro, para azular o balanço, o governo fez uma manobra contábil com uma operação de capitalização da Petrobras. É pura maquiagem. Não entrou dinheiro nenhum para os cofres públicos. “Na prática, na tentativa de atingir a meta de 3,3% do PIB do superávit primário, este ano, o governo Lula - como já fizera na capitalização do BNDES - aumenta a dívida pública bruta (...). A ousadia irresponsável na manipulação contábil é mais uma herança maldita deixada para o próximo governo. Pois o efeito dessas maquiagens é reduzir a credibilidade das estatísticas públicas e, por consequência, aumentar o risco dos papéis brasileiros, públicos e privados, no mercado financeiro. Esperteza, quando é demais, vira bicho e come o dono” (Agência O Globo, 29/10).
O governador eleito de Minas, Antonio Anastasia, do PSDB, é um dos que são a favor da CSS. Ouvi-o dizer, assim como já disse o presidente Lula, que não viu nenhum produto baixar de preço com o fim da CPMF, num cinismo que me causa ânsia de vômito. Se nada ficou mais barato, é porque já há uma tributação excessiva sobre a produção e a comercialização. Apenas se afrouxou cerca de meio centímetro na corda do pescoço do contribuinte enforcado, que respira com dificuldade e que não ganhou nada, só passou a perder menos. Para terminar, digo que pressinto uma guerra interna no poder, pois o PMDB tem uma sede louca por pastas com orçamento alto. É tomar um bom digestivo e esperar para ver. Quero falar um pouco sobre a comparação entre Lula e FHC, mas fica para o próximo texto.
Paulo Pereira da Costa, promotor de Justiça e autor do livro “Pensando na Vida” paulopereiracosta@uol.com.br