Um processo no judiciário brasileiro é muito pior que as novelas das nove da Rede Globo. Quando parece que algo de novo vai acontecer, desenrolar, eis que surge um novo prazo, um novo recurso, um próximo capítulo. As leis já sofreram tantas emendas e não ajudam no andamento processual, permitindo muitas brechas para adiar a sentença. Os advogados dependendo do interesse nas causas tentam atrasar o máximo possível o trânsito em julgado (decisão final na qual não caiba mais recurso) e exploram ao extremo os recursos. É recurso que não “cabe” mais apelação, embargos, agravos, e assim por diante.
Como se isso não bastasse, há ainda os 4 graus de jurisdição cortesia, quase exclusiva do nosso Brasil. São eles: os juízes de 1ª instância; 2ª instância, os tribunais TJ (Tribunal de Justiça), TRE (Tribunal Regional Eleitoral), TRT (Tribunal Regional do Trabalho), TRF (Tribunal Regional Federal); 3ª instância os tribunais superiores, STJ (Superior Tribunal de Justiça), TSE (Tribunal Superior Eleitoral), TST (Tribunal Superior do Trabalho), TSM (Tribunal Superior Militar); e por último, 4ª instância o Supremo Tribunal Federal, STF. Mas existe aqui algo de proporcional. Observem: quanto mais dinheiro tiver a parte, mais recursos haverá o processo e mais demorado ele será. E no final de seu trajeto, depois de 10, 15, 20 anos nem sempre sobra pena aos culpados.
Para esse último mal supracitado há uma proposta do presidente do STF, o ministro Cesar Peluso. Ele quer uma mudança significativa no trâmite dos recursos, defendendo que as punições sejam impostas após a decisão de 2ª instância. Os réus manteriam o direito de procurar os tribunais superiores, mas o recurso perderia o caráter suspensivo. Peluso já levou pessoalmente sua proposta à presidente Dilma, que incumbiu o ministro da justiça, José Eduardo Cardozo, para preparar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC).
E paralelamente a PEC, para tentar acelerar a justiça e fazer ela “correr”, tramita no Congresso Nacional, o novo código de processo civil e o novo código de processo penal que são as leis que orientam todo o trâmite processual. O Senado convocou duas comissões de juristas para fazer os novos códigos. Missão completa, tendo sido até votado os dois projetos pela casa no final do ano passado e encaminhado a Câmara dos Deputados, espera-se que seja aprovado até o final deste ano.
O atual código de processo civil é de 1973 e as principais mudanças são: 1- estimular a conciliação entre as partes; no início de todo o processo um conciliador vai procurar os envolvidos para tentar chegar a um acordo. 2- proferir a mesma sentença em casos iguais; se houver vários processos tratando do mesmo assunto, a sentença que for proferida para o primeiro aplicar-se-á aos demais. 3- reduzir as interrupções no andamento processual; todos os recursos apresentados no decorrer da ação serão julgados juntos ao final do processo. 4- encolher os prazos de cada etapa dos processos e o número de testemunhas; o prazo máximo de cada fase terá quinze dias úteis. Cada parte poderá arrolar apenas cinco testemunhas.
Já no processo penal de 1941 as maiores alterações são: 1- oferecer a negociação de pena; caso o réu confesse o crime, seu advogado poderá negociar a pena com a promotoria, valerá para os crimes puníveis com até oito anos de reclusão. 2- limitar o número de recursos; será permitido apresentar apenas um embargo em cada instância. 3- fixar um prazo para a prisão preventiva; o limite será de 180 dias para quem espera julgamento e de 360 para condenados que ainda podem recorrer. 5- permitir o interrogatório do réu por videoconferência; o juiz poderá ouvir o réu onde ele estiver por meio de um sistema de câmeras e monitores, desde que a medida seja para garantir a segurança pública ou proteger a vítima.
Entretanto, para uma boa parte de cidadãos, nada mudará, porque a Fazenda Pública tinha, tem e sempre terá o prazo em dobro para recorrer. A execução contra a Fazenda é demorada e o estado costuma usar todos os recursos, mesmos sabendo que irá perder no final. Diria que é o estado pelo estado e o povo que “se lasque”. Findo o processo, ele entra na fila dos precatórios.
Parafraseando uma frase do nosso tempo o estado diz: “devo e não nego, mas pago se eu quiser”. A justiça vai começar a deixar seu estado de morbidez para começar a dar seus primeiros passos rumo ao século XXI. A esperança é de dias melhores, processos mais ágeis e a certeza de uma justiça que pode chegar a qualquer parte do nosso país. Por enquanto, é só um desejo muito antigo... porém, a estátua começará a andar... e quem sabe um dia, “correr”.
Renan Gratão é estudante de Direito - Unifev
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