O 21 de setembro de 2011 entra para a história como o dia em que os deputados deram ao País a chance de investigar episódios de um período obscuro da vida nacional, em que as restrições às liberdades individuais e coletivas eram regra.
A aprovação do projeto que cria a Comissão Nacional da Verdade, do qual fui escolhido relator, é uma demonstração de maturidade do Parlamento brasileiro, e reforça o compromisso com o restabelecimento da verdade histórica, sem ódio, nem revanchismo.
Reabrir antigas feridas, sabemos, exacerba sentimentos, seja de quem violou os direitos humanos, seja de quem sofreu a dor da injustiça.
Reconheço os esforços iniciados pelo ex-presidente Lula, e concluídos pela presidente Dilma Rousseff, na busca de consenso sobre tema tão embaraçoso. Louvo, sobretudo, a boa vontade e o espírito cívico das lideranças partidárias, permitindo que a Câmara Federal obtivesse, em uma única noite, o entendimento que por anos a fio não se imaginava alcançar.
Com esta votação, a Câmara permite jogar luzes sobre fatos que ainda não foram escritos por nossos historiadores. Casos sobre os quais vamos nos debruçar agora, para entregar ao País os esclarecimentos que a sociedade espera e merece.
Os sete integrantes da Comissão da Verdade serão escolhidos pela presidente Dilma. A tarefa que lhes cabe é examinar as violações de direitos humanos praticadas no Brasil, de 1946 a 1988, ano da promulgação da atual Constituição.
O período investigado abarca longos anos de tensão política e institucional. É essencial apurar não apenas as violações da ditadura militar, mas também as tensões que precederam o golpe militar de 1964, como a saída de João Goulart e a cassação de parlamentares que resistiam à ruptura institucional.
A Comissão não terá caráter punitivo, mas abrirá os arquivos secretos onde quer que estejam. Terá poderes para requisitar documentos públicos ou privados, e prover meios e recursos para localizar desaparecidos políticos, para que suas famílias possam enterrá-los e fazer o rito de passagem. A justiça brasileira dará a palavra final sobre o que vier à luz.
O número de sete membros é suficiente para a Comissão. O grupo terá suporte da Casa Civil e de funcionários comissionados. Comissões similares instaladas em outros países tiveram estrutura parecida. No Chile foram oito membros; na Argentina, onde ocorreram mais de 30 mil violações, 13 membros; na Guatemala e El Salvador, 3; e no Peru, 12.
A Comissão da Verdade consolida o processo democrático iniciado com a Lei da Anistia, com o movimento que levou às eleições livres e diretas e desaguou na Constituinte de 1988, e que avançou ainda mais com a constituição da Comissão de Mortos e Desaparecidos e a Comissão de Anistia.
O velho MDB de Ulysses Guimarães, e de tantos outros guerreiros, esteve à frente da luta contra a ditadura e pelo restabelecimento da liberdade e da democracia em nosso País. Agora, o PMDB foi o fiador do acordo que permitiu criar a comissão.
A resistência às injustiças foi construída com passos firmes, que mudaram nossa caminhada e o nosso jeito de caminhar de agora em diante.
Seria emblemático homenagear a coragem e a ousadia do deputado Rubens Paiva, desaparecido em 1971 durante o regime militar, dando seu nome ao projeto que acabamos de aprovar. É o que proponho.
Para uma Nação grande e livre, nunca é tarde para reescrever a história, fazer justiça e restabelecer a verdade”.
*Edinho Araújo é deputado federal pelo PMDB-SP e relator do projeto que cria a Comissão da Verdade