Duas mulheres, duas brasileiras nas manchetes dos jornais nos últimos dias por motivos diferentes. Uma tratada como heroína nas Olimpíadas de Londres: Yane Marques, medalha de bronze no pentatlo moderno, primeira medalhista olímpica individual de Pernambuco. Outra, Roseli Pantoja, enfrentando o tiroteio de uma Comissão Parlamentar de Inquérito no Congresso Nacional.
Diz o jornal: “Jeito tímido, simples, sem estrelismos, Yane, a sertaneja de Afogados da Ingazeira, sertão pernambucano, 28 anos, desembarcou ontem, às 11h50m, no aeroporto dos Guararapes, no Recife, como heroína. Dizia umas faixas colocadas no aeroporto: “Quem diria que entre os mandacarus dessa seca nasceria uma flor/ Yane Marques é seu nome.” Outra faixa: “Do sertão para o mundo”.
Diz o jornal: “Roseli Pantoja da Silva virou exemplo. Chegou à CPI do Cachoeira na condição de empresária milionária, dona da Construtora Alberto & Pantoja, e saiu de lá como uma cidadã brasileira pobre, que teve o nome usado de forma criminosa pela Delta, empreiteira investigada por montar um esquema de empresas fantasmas para lavar dinheiro e financiar campanhas políticas. Ela, que é dona apenas de uma banca na Feira de Importados, foi de ônibus para o Senado e, sem nenhum advogado ou assessor, sentou-se na bancada diante de 23 parlamentares e não deixou de responder a nenhuma pergunta. Envergonhou políticos, empresários e funcionários públicos que, escorados em habeas corpus, se calaram”.
Duas histórias que levam a pensar e refletir.
Quinta neta de Otília e José Cerquinha de Fonseca, Yane era descrita pelos orgulhosos avós maternos como uma “criança trelosa, ativa, disposta, sempre a subir em árvores, descalça, correndo pela rua, brincando de bola de gude, como um menino”. O avô, mais conhecido como Zé Coió, lembra que, sempre que Yane vai ao sertão, faz questão de visitar todos os que a conhecem e participaram de sua infância. É de família de poucos recursos. Yane enfrentou dificuldades para manter o seu sonho. Foram determinantes sua força de vontade, persistência e disciplina. A mãe Goretti, no tempo das vacas magras, sem patrocínio ou apoio, fazia salgadinhos -‘a coxinha era o carro’– para sustentar a família. E Goretti foi a Londres para acompanhar a filha, impulsionando-a nas provas com gritos de ‘Vai, mainha!’. Segundo Yane, escutar o grito da mãe em meio à torcida sempre a revigorava.
Roseli Pantoja, logo no início do depoimento na CPMI, revelou que só ficou sabendo pela internet que era dona de uma empresa de engenharia que, nos últimos anos, recebeu R$ 27,7 milhões da Delta. Segundo ela, seu ex-marido –‘um homem pobre e endividado’ - abriu uma conta bancária, tomou empréstimos para abrir uma loja de artigos para roqueiros na Feira dos Importados e não pagou. “Por isso, meu nome foi parar no Serasa”.
Duas mulheres mostrando a cara e a coragem. Uma veio de baixo, do sofrido sertão nordestino. Outra é trabalhadora. Ganha o pão com o suor do seu rosto. Quando se vem de baixo, não são as glórias, momentâneas ou não, o mais importante. O que mais interessa são as conquistas da vida, a dignidade. A mãe vencedora, dona Goretti, fazendo coxinhas para que a filha pudesse realizar seus sonhos. Ou pegar o ônibus, ir ao Congresso Nacional e enfrentar deputados e senadores com destemor.
As mulheres brasileiras, a cada dia que passa, mais vão mostrando seu valor. Não porque estão na Presidência da República ou em qualquer outro cargo de relevo. Mas porque trabalham, porque sabem o que querem, porque sonham, porque enfrentam o mundo com determinação e cabeça erguida. Como Yane e Roseli e tantas outras Yanes e Roselis.
Disse o senador Pedro Tacques, ao final do depoimento de Roseli: “A senhora é a única brasileira que veio aqui contribuir com a verdade e sem advogados. Parabéns”.
Disse Yane: “Seria muito bom se esta fosse a última Olimpíada com uma única atleta representando o Brasil nessa modalidade. Em 2016, espero vários brasileiros e brasileiras competindo no pentatlo moderno nas Olimpíadas do Rio”.
Viva as mulheres!
*Selvino Heck é assessor especial da Secretaria Geral da Presidência da República