Mateus Casarotti (Foto: Arquivo pessoal)
Começaremos a coluna de hoje estando atentos a uma máxima do direito, a frase em latim “ubi societas, ibi jus”, que significa “onde há sociedade, há direito”. Mais uma vez nas manchetes dos jornais de grande circulação brasileiros surge uma notícia que envolve um instituto jurídico que apesar de muito conhecido, não é plenamente compreendido por todos.
Veio à tona um suposto acordo de colaboração premiada do principal suspeito pelo assassinato de Marielle Franco, o ex-policial Ronnie Lessa. O instituto da colaboração premiada tomou relevância e se tornou de conhecimento geral do povo brasileiro nas investigações que envolviam a Operação Lava Jato; na época, os jornais brasileiros foram tomados pelas notícias sobre a delação de Joesley Batista, um dos donos da empresa JBS.
Apesar do nome “delação” ser mais amplamente difundido e ser geralmente utilizado pela imprensa para descrever esses casos, o nome do instituto previsto em lei é colaboração premiada; o termo “delação” foi retirado para tentar amenizar o estigma de delator daquele que aceita os termos de uma colaboração premiada. Há ainda parte da doutrina jurídica que defenda a existência de ambas as formas, sendo a delação premiada uma das espécies de colaboração premiada.
Prevista na Lei 12.850/13 (Lei das Organizações Criminosas), a colaboração premiada é conceituada por um “negócio jurídico processual e meio de obtenção de prova, que pressupõe utilidade e interesse públicos”. Pode-se também dizer que é um mecanismo jurídico utilizado entre quem acusa e o defensor, com a finalidade de facilitar a investigação criminal em troca de benefícios.
O acordo de colaboração premiada pode ser feito pelo Ministério Público e pelas Polícias Federal e Civil. Para que o suspeito possa fazer jus ao instituto ele deve necessariamente ter participado de um crime onde mais pessoas estejam envolvidas, ou seja, o concurso de agentes para o cometimento do delito. É também obrigatório que aquele colaborador esteja assistido por um advogado ou defensor público.
O artigo 4º da Lei 12.850, prevê em seus incisos um rol de resultados necessários que as informações passadas pelo colaborador devem atingir para que este faça jus aos benefícios, são eles: a identificação de coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; a revelação da estrutura hierárquica da organização criminosa; a prevenção de outras infrações; a recuperação total ou parcial do produto do crime; e a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.
Atingindo um ou mais destes resultados o colaborador poderá ser concedido o perdão judicial; a redução em até 2/3 (dois terços) da pena privativa de liberdade ou sua substituição por restritiva de direitos; imunidade processual, na hipótese de o Ministério Público deixar de oferecer denúncia; e redução da pena até a metade ou progressão de regime (ainda que ausentes os requisitos objetivos), nos casos de colaboração após a sentença.
Cabe dizer que a colaboração premiada ainda é muito estudada e debatida pelos juristas e tribunais superiores, não sendo possível aqui esgotar toda sua complexidade. O que é certo é que a justiça brasileira tem visto com bons olhos este tipo de possibilidade na investigação criminal, e devemos ter no futuro uma evolução natural do mecanismo para que seja cada vez mais utilizado, uma vez que vem dando resultados positivos.
Mateus Casarotti, advogado, especialista em Direito Imobiliário, sócio do escritório Casarotti Pereira Advogados.