Psicóloga infantil destaca que os pais precisam explicar para as crianças o objetivo da mesada
Andressa Aoki
andressa@acidadevotuporanga.com.br
Oferecer mesada aos filhos é sempre um grande desafio. Quando saber qual a idade certa e qual responsabilidade ser cobrada, são perguntas frequentes para os pais. A mesada, por si, não é uma obrigação. Não está previsto na legislação nem no Estatuto do Menor e do Adolescente. Entretanto, pode ser uma forma de contribuir para o desenvolvimento da noção de organização. Se um dia esse acordo for assumido entre pais e filhos, então, terão que pagar e na forma que for combinado.
O especialista em educação financeira, Álvaro Modernell, explica que compromissos devem ser honrados, principalmente diante dos filhos. Ainda mais se forem relacionados a dinheiro. "Isso é um dos fundamentos básicos da educação financeira. Dizem que dívidas de jogo são sagradas, mas acho que sagradas são as dívidas com os filhos. Inclusive as de mesada", diz.
Para ele, a mesada é um instrumento de educação financeira que pais, avós, tios ou padrinhos assumem voluntariamente com as crianças. Há quem questione a idade que deve se começar a pagar mesada às crianças, relacionando à falta de maturidade de algumas para lidar com o próprio dinheiro.
Mas poucas vezes se vê esse tipo de questionamento em relação aos pais. Será que todos os pais estão preparados para dar mesada aos filhos? Para dar mesada também é preciso preparo, conscientização, organização e responsabilidade.
A psicológa infantil de Votuporanga, Andrea Soraia Ferreira Bruniera, destaca a melhor idade para conceder este benefício que tem como consequência a independência. "A mesada depende do seu objetivo e da idade da criança. A partir dos 8 e 9 anos, é o mais aconselhável", afirma.
Andrea ressalta que nesta idade a criança tem sua noção de tempo acentuada. "Para os pequenos de 5 e 6 anos é complicado explicar que daqui alguns meses conseguirão o dinheiro para comprar o que desejam. Eles não entendem e ficam agitados", enfatiza.
A psicóloga conta que a mesada faz com que a criança se organize e tenha noção do valor das coisas. "Tem alguns filhos que ganham tudo sem nenhum esforço. A mesada precisa ser de acordo com a realidade da família", alerta.
Ela diz ainda que os pais precisam colocar objetivos. Por exemplo, se o dinheiro é para o lanche, para comprar brinquedos. "É necessário conversar com a criança e estipular o valor, qual o período da mesada e suas regras. Mesmo assim, o dinheiro precisa ser monitorado, não se pode deixar fazer o que querem. Se a mesada for de R$ 5 e quer comprar tudo em balas, os pais precisam controlar", orienta.
Andrea destaca que o dinheiro não pode ser utilizado como gratificação. "Não pode haver diálogo no sentido do filho tirar boa nota e receber mais mesada. Ele tem que entender que na vida, muitas coisas dependem de esforço e que nem sempre se ganha adicional por isso. A escola tem que ter o seu mérito e pelo trabalho. Caso contrário, a criança começa a inverter o papel e direcionar suas notas a recompensas", diz.
Pagamento da mesada
Os pais devem saber que seu exemplo influencia diretamente à formação da personalidade e do caráter dos filhos, inclusive nas relações com o dinheiro. "Então, pais que assumem e cumprem compromissos com os filhos passam- lhes uma mensagem de responsabilidade. A chance de seus filhos serem bons pagadores e pessoas de palavra, por exemplo, torna-se maior", afirma especialista em educação financeira, Álvaro Modernell.
Por outro lado, pais que negligenciam datas de pagamento, que barganham valores, que atrasam ou adiantam os pagamentos estão “dizendo” indiretamente aos filhos que compromissos podem ser descumpridos.
"Estão mostrando que a inadimplência sistemática é tolerável, no conceito deles. Que os devedores podem ser irresponsáveis. Que a desorganização financeira é algo natural. Que cada um pode pagar quando e quanto quiser dos seus compromissos. Das suas dívidas", completa.
Com relação às datas de pagamento, os pais devem respeitar rigorosamente, como se fosse um empréstimo bancário. "Prometeu pagar aos domingos, ou todo dia 5, então pague nessas datas. Nem antes, nem depois. Prometeu pagar R$ 10, R$ 20 ou R$ 50 de mesada? Pague esses valores. Nem mais nem menos. Nada de usar desculpas como “esqueci de sacar” ou “não tenho trocado”. Saia de casa, vá ao caixa eletrônico, carregue o cartão da mesada, faça o que for necessário, mas não deixe de pagar em dia a mesada. Muito menos de querer justificar o não pagamento atribuindo a culpa à criança, como por causa de mau comportamento ou baixo desempenho na escola. Ainda mais se for uma desculpa furada", sugere.
E se não conseguiu o dinheiro no prazo, o especialista orienta que na eventualidade de algum atraso, pague multa e juros por isso. "No caso de eventual pedido de adiantamento, caso você concorde isso, negocie juros, ou seja, desconte uma parte. Isso mesmo! É importante que as crianças aprendam que dinheiro tem um custo no tempo e a desorganização financeira geralmente resulta em gastos. Por isso, o melhor é que elas aprendam a organizar e respeitar o próprio orçamento, baseado no valor e na periodicidade da mesada que foi acordada com os pais", afirma.
Valor da mesada
Existem teorias que sugerem calcular o valor da mesada a partir da idade das crianças, atribuindo R$ 1 para cada ano de vida, por semana. É um parâmetro que se mostra injusto e inadequado para muitas famílias, pois não considera outros fatores e nivela crianças pobres com as mais privilegiadas; as que vivem no interior e as que vivem em grandes centros; as conscientes e as deslumbradas, famílias com filhos únicos com as mais numerosas. Não existe uma regra que atenda todos os casos. Nem mesmo a maioria. Outros especialistas recomendam um percentual do salário mínimo. Mas isso também seria inadequado, pode levar a criança a confundir mesada com salário. Além disso, crianças que demonstram ter uma relação sadia com o dinheiro devem ter essa postura reconhecida. E estimulada. Manter valores muito baixos dificulta esse avanço na relação dela com o dinheiro.
O ambiente social é importante. Em casos de dúvida é bom os pais conversarem com os pais dos amigos de seus filhos para avaliar as práticas e os valores de cada um. Em termos de socialização, o ideal é que o valor da mesada dos seus filhos fique compatível com seu círculo de amizades. Na dúvida, é melhor ser conservador.
É importante que a mesada reflita para as crianças a situação da família. Uma família que viva com dificuldades financeiras não deveria oferecer uma mesada polpuda aos filhos. Da mesma forma que famílias mais abastadas não devem impor restrições financeiras rigorosas aos filhos. Atitudes como essas podem levar ao distanciamento dos valores e da realidade da família e dificultar a compreensão por parte das crianças.
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