As exigências da dinâmica da sociedade, influenciando as atividades das familias, fez com que o papel do educador se tornasse cada vez mais importante no processo de formação de crianças e jovens, tanto de escolas públicas quanto privadas. Por isso, além de construir as bases do conhecimento, os educadores têm hoje a tarefa fundamental de ajudar a formar cidadãos éticos, comprometidos com a defesa dos Direitos Humanos, a promoção da Justiça Social e dos valores democráticos.
Tal tarefa se torna mais difícil quando se verifica o aumento da violência, particularmente dos crimes raciais e de intolerância. Somente no estado de São Paulo, entre janeiro e agosto deste ano, foram lavrados mais de 400 boletins de ocorrência na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), unidade da Polícia Civil criada em 2006 especialmente para investigar esse tipo de crime. Outras inúmeras ocorrências decorrentes dessas práticas intolerantes surgem diariamente, mas não viram estatísticas porque as vítimas preferem não registrar denúncia.
Para coibir esses crimes bárbaros, há apenas duas formas de atuação. A primeira é o alerta constante, não só das autoridades do governo, mas da sociedade como um todo, que deve sim recorrer às denúncias como forma de proteger cidadãos ameaçados pela violência de indivíduos, gangues ou grupos organizados.
A segunda forma de atuação, que também envolve toda a sociedade, é obtida por meio de um intenso, consistente e longo trabalho de educação para a cultura de paz. Esse processo deve começar desde cedo, ensinando-se às crianças que pessoas diferentes, com crenças e costumes diversos, podem e devem conviver harmoniosamente em um mesmo lugar. E aí entra o papel fundamental do educador, que tem como desafio passar esses valores em sala de aula de modo que os alunos efetivamente os absorvam e pratiquem.
Algumas entidades da sociedade civil comprometidas com os Direitos Humanos realizam importante trabalho de auxílio nesse processo de educação, como a B’nai B’rith (Filhos da Aliança, em hebraico), que atua há 80 anos no Brasil e em mais de 50 países há quase 170 anos.
No último dia 25 de agosto, a entidade realizou a Jornada “Intolerância em Tempos de Nazismo – da Exclusão à Solução Final”, que reuniu cerca de mil educadores da rede pública de ensino em São Paulo. O objetivo foi mostrar a eles estratégias pedagógicas para abordar questões ligadas ao racismo, à intolerância e à convivência na diversidade, tendo o Holocausto como referência. Em parceria com o Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação da Universidade de São Paulo (LEER – USP) e com o ARQSHOAH, departamento desse laboratório, o evento mostrou como a multidisciplinaridade – por meio da ciência e da arte – pode ajudar no processo educacional, fazendo com que desde cedo, crianças e jovens aprendam e disseminem valores humanistas e democráticos.
A iniciativa da entidade foi de grande ajuda, mas não se restringe à Jornada. Até o final de 2012, a B’nai, novamente em parceria com o LEER – USP, lançará o Instituto Shoah de Direitos Humanos (ISDH), que servirá como fonte de conhecimento e de auxílio no processo de educação e construção da cultura de paz.
Com vasto material, o ISDH estará à disposição não apenas a educadores e seus alunos, mas também para juristas, formadores de opinião e pela sociedade civil em geral. O acervo permitirá o compartilhamento de experiências, incluindo o registro das vivências de sobreviventes do Holocausto que escolheram o Brasil como sua pátria. Com estratégias multidisciplinares, o instituto atuará na conscientização da população sobre os perigos da proliferação de ideais racistas, discriminatórios e intolerantes.
A tolerância é uma virtude essencial das sociedades democráticas. A coexistência pacífica entre diferentes pessoas, povos, religiões e culturas só será possível quando cada ser nesse mundo tiver incorporado, em sua essência, o conceito de cultura de paz e os valores universais dos Direitos Humanos. E isso só será possível com a participação ativa da escola, seus educadores e das famílias. Assim, no futuro, quem sabe a intolerância se torne apenas uma trágica lembrança da história humana.
* Abraham Goldstein é presidente da B’nai B’rith no Brasil