A grandiosidade da existência humana não está na sua capacidade de ser um ente que comunga das várias formas de existência, pelo menos das quatro aristotelicamente concebidas: material, vital, animal e espiritual. Muito além de banhar-se dessas naturezas, o homem é um ser único, improvável e irrepetível.
Único, pois a sua unidade corpórea o insere no ápice do ato criativo e, por si só, o homem é o ágape das naturezas conhecidas, de maneira que escondido por sua persona (pessoa), descobre-se ente material, carregando consigo as marcas de quase toda a tabela periódica, ao mesmo tempo que comunga da mesma vida de uma simples planta, move-se e instintivamente sobrevive como os seus irmãos animais.
O problema da unicidade é que quase sempre nos esquecemos de nossa composição é etérea, frágil, inconstante. Valorizamos nossas substâncias materiais e, mesmo na mais tenra idade, muitos de nós se veem obrigados a recompô-las por meio de complexos vitamínicos ou outros tratamentos. Assim, também, com nossa constituição vital, móbil e instintiva.
E, além das nossas constituições corpo-vital-instintivas, está para o homem uma faculdade acidental: sua improbabilidade. Uma combinação de fatores faz com que mesmo duas pessoas “idênticas”, como é o caso dos gêmeos univitelinos, constituídas da igual carga genética e fenotípica, sejam seres absolutamente distintas.
Justamente aí, na improbabilidade, ou seja, na contigencialidade do ser humano, que o mistério do Arquiteto Universal se esconde ao mesmo tempo que se revela. Emmanuel Levinas, um grande filósofo do século passado, judeu de nascimento e prática, afirmava que diferentemente do que os existencialistas tratavam, o outro não apenas me revela, mas o outro me revela o infinito.
Por isso, nossa irrepetibilidade era para Levinas a prova cabal de que uma pessoa nasce não só para si, porque não teria sentido em si mesma, nem apenas para outrem, pois, assim, se anularia. Mas, todo ser humano constitui-se para si, para o outro e para o Outro(Deus).
Daí, a busca da felicidade não pode estar baseada no insuflar das nossas naturezas etéreas e, sim, num processo vital de “abandono” daquilo o que é supérfluo, que passa, que se transforma e que se corrompe ao sabor do tempo.
Enfim, passar a vida buscando satisfazer suas necessidades temporais não é o caminho para a felicidade. Seremos felizes quando buscarmos o essencial, que é belo, simples e eterno.
*Padre Marcio Tadeu Reiberti Alves de Camargo é pároco da Paróquia Senhor Bom Jesus