Não parece haver dúvida de que o individualismo e o imediatismo da consciência humana encontraram seu santuário na cultura contemporânea. Estamos vivendo em uma nova era, se olharmos para os hábitos dos adultos. Mas se olharmos com os olhos dos jovens, adolescentes e crianças, que são os nossos alunos, não há nenhuma novidade; trata-se do mundo velho no qual nasceram.
Nesse contexto, o primeiro desafio lançado à comunidade educativa, integrando família e escola, consiste em saber usar a tecnologia da era digital a serviço da educação da potencialidade humana para a sociabilidade e para a construção de um conhecimento socialmente significativo.
A facilidade que a tecnologia nos oferece manifesta-se inicialmente no cultivo da virtualidade. A virtualidade das relações é seguramente o maior desafio para a educação no século XXI, uma vez que o espírito pós-moderno que caracteriza, em termos genéricos, a sociedade contemporânea é o da liberdade entendida como libertação dos vínculos, dos compromissos duradouros, liberdade para viver o momento, sem necessidade de projetos ou memórias.
Nessa dinâmica, a presença virtual cultiva tanto a sede por estar em uma comunidade quanto a renuncia às implicações da vida comunitária, que se traduziriam em confrontos, conflitos, decisões, renúncias, vida autêntica. Os maiores desejos dos indivíduos nessa cultura pós-moderna passam muito longe das implicações políticas, do engajamento social, da responsabilidade pelo outro. Por isso, o projeto educativo da escola conjugado com a presença atuante dos educadores deve ser alimento para a aprendizagem de um dos pilares que a UNESCO coloca para a educação do século XXI: o aprender a conviver. Trata-se de aprender as competências que a vida em sociedade exige de seus cidadãos.
Portanto, a humanização do ser humano acontece no vis-a-vis, no face-a-face, diante do olhar do outro que nos interpela, solicita-nos ao engajamento. Assim, a presença da alteridade é critério ético e caminho para a educação política do ser humano. Em decorrência disso, solicita-se dos educadores a criação de situações e de vivências que fomentem a convivência dos alunos e a construção de projetos sociais, ecopedagógicos nos quais possam atuar como voluntários, no exercício de sua cidadania.
Com efeito, o tempo e o espaço da educação são marcados pela lapidação da alma humana, no cotidiano de uma existência real, em comunidades reais, nas quais se nasce para o mundo e deve-se aprender e construir os valores da responsabilidade, da ética do cuidado, da solidariedade, do compromisso e do engajamento com os grandes desafios e projetos da vida cultural, social e política da comunidade.
Ora, o primeiro objetivo da educação, mesmo antes da aquisição da linguagem, é cultivar a potencialidade para a sociabilidade, lutando contra a impulsividade individualista que marca nossa primeira natureza.
Se a tecnologia quer e facilita o processo de imediata recepção e aquisição de bens e serviços, na educação não deve haver espaço para a facilitação, pois é da identidade da educação ir contra os nossos impulsos primários. Aqui se encontra um dos motivos de termos que entender e trabalhar todas as reações ou indisposições possíveis que podem acompanhar esse terreno da educação. A nossa tendência é para a acomodação, e a educação tem compromisso com a desinstalação, com o desenvolvimento, com um horizonte de vida sempre mais ampliado.
Se a tecnologia pode trazer, imediatamente através de um click, algo pronto, a educação é o lugar da construção. Ora, a construção requer fundamentos. E a construção dos fundamentos requer investimento de tempo para o mergulho nas profundezas do espírito. Esse mergulho requer, inicialmente, a aprendizagem da solidão. Somente na solidão existe o verdadeiro encontro consigo mesmo, condição prévia para uma aprendizagem significativa.
Nessa dinâmica compreende-se a solicitação de Santo Agostinho ao seu interlocutor: “Conhece-te, aceita-te, supera-te.” Ora, essa solicitação estabelece o ponto de partida: “Recolhe-te no teu interior e afasta-te de todo medo. Volta o olhar para teu interior, onde não há barulho, nem contendas, onde tens um retiro tranquilo para a tua consciência. Atende com calma e serenidade à verdade para que a entendas” (Sermão 52, 22).
Dessa forma, o terreno da educação é o da inquietude de um espírito disposto à lapidação. Ora, sabemos que o processo de construção do conhecimento requer a inicial apropriação significativa por parte do sujeito. Somente após esse mergulho, seguem-se novos desafios. Entre esses novos desafios destacamos três: 1. Verificar a solides do fundamento, através de desafios e permanentes desequilibrações construídas para fortalecer a reapropriação do fundamento. 2. Fomentar o processo de socialização dessa aprendizagem, que requer encontros reais com os demais parceiros da comunidade investigativa. Dessa socialização nascerão novos elementos que desafiarão cada parceiro para a revisão de sua construção. 3. Direcionar a construção para a resolução de situações problema da vida da comunidade, pois o foco da educação está na construção de competências e habilidades socialmente significativas e verificáveis.
*Celito Meier é teólogo, filósofo e educador