No recente Sínodo, realizado no passado mês de outubro, causou surpresa uma proposta, que soava no mínimo como original.
O assunto girava em torno dos caminhos para a transmissão da fé. Foi então que alguém lembrou a proximidade que sempre existiu entre a fé e a arte. A arte pode se tornar um bom caminho para conduzir à fé. Ela desperta nossa sensibilidade para o belo, que é predicado divino. Pois uma das tentativas de expressar a realidade divina é entendê-la como a realização suprema do bom e do belo.
Neste contexto toma forma a expressão latina, que identifica na beleza um caminho para a fé. A “via pulchritudinis”, o “caminho da beleza”. Se tomamos o caminho da vida na estação da beleza, percebemos então que a vida vai nos dando muitos motivos de admirar a natureza. E esta, por sua beleza, nos enseja a “ligação” que podemos fazer, buscando a coerência maior que a fé proporciona, identificando a natureza como sinal de uma plenitude em que o belo e o bom passam de predicado para substantivo sem limites.
Se reparamos bem, os salmos da Bíblia nos mostram, de diferentes maneiras, como a beleza do universo se torna caminho de fé, que nos leva a louvar e agradecer ao Criador do universo.
O salmista, extasiado diante da harmonia do universo, pergunta com admiração frente a tanta beleza: “Que é o homem para o cuidardes com tanto carinho?”
Como resposta, percebe o homem envolvido nos grandes planos de Deus: “Pouco abaixo de Deus o fizestes, de glória e honra o coroastes!”.
Ao longo da história, a Igreja se mostrou parceira dos artistas. Eles souberam se inspirar no mundo da fé, para idealizar suas grandes obras de arte. Existe uma interação entre fé e arte. A fé inspira a arte, e a arte acaba confirmando a fé.
Quem entra, por exemplo, na basílica São Pedro, se depara com a famosa estátua da Pietà, feita por Michelangelo quando ele tinha 22 anos de idade. Diante desta estátua genial, quem se atreve a acusar o artista de idólatra, por ter feito uma imagem? A arte convida a erguer nosso espírito para o alto, e não para enclausurá-lo em questiúnculas equivocadas.
Podemos lembrar outra obra do mesmo artista, desta vez em forma de pintura, o famoso quadro do Juízo Final, na parede principal da Capela Sistina. A fé proporcionou ao artista o tema de sua obra. E a obra de arte imortalizou o Evangelho simbólico do Juízo Final.
A fé estimula os artistas, e os artistas acabam prestando um bom serviço para a fé.
Disto precisa resultar uma preocupação, que vai se mostrando cada dia mais urgente. Como preservar nosso patrimônio artístico, traduzido, sobretudo, nas construções de nossas Igrejas. Muitas vezes elas ficam expostas a deformações, oriundas de iniciativas de reformá-las, sem levar em conta o que o projeto original queria expressar.
Em todo o caso, a “via pulchritudinis” merece ser mais valorizada. Para que a beleza do universo, obra de Deus, junto com a beleza das obras artísticas, se torne um caminho propício e fecundo, de reencontro da fé e de sua oportuna transmissão.
Assim, o belo e o bom poderão andar de mãos dadas, e a justiça e a paz se abraçarão.
Aí o mundo vai ficar muito mais bonito do que está.
*Dom Demétrio Valentini é bispo diocesano de Jales