Temos recebido críticas por não aceitarmos o novo modelo de Escola de Tempo Integral na E.E. Dr. José Manoel Lobo, por isso são necessários alguns esclarecimentos a esse respeito, para que a população entenda o porquê da não aceitação, já que da forma como a mídia local tem publicado ficou parecendo que nós, professores, não queremos melhorar a qualidade do ensino oferecido nas escolas públicas.
O principal motivo da rejeição é que se trata de um projeto de exclusão. Desde a segunda metade do século XX, trabalha-se para que no Brasil possamos ter uma escola pública verdadeiramente inclusiva; os métodos de ensino, as práticas pedagógicas têm caminhado no sentido de construir uma escola para todos, e esse novo modelo de ensino em tempo integral apresenta uma proposta de exclusão, uma vez que os alunos de nossa escola, principalmente do Ensino Médio, já estão no mercado de trabalho, muitos deles contribuem com o sustento da família, esses já estariam fora do projeto e, consequentemente, de nossa escola. Eles teriam de procurar outra unidade escolar, longe de suas casas ou superlotar escolas que não têm estrutura para receber um número grande de alunos, pois a E.E. Dr. José Manoel Lobo possui 10 salas de Ensino Médio só no período da manhã, fora as salas de Ensino Fundamental do período da manhã e da tarde. Isso já faria com que muitos de nossos alunos desistissem de estudar, pois a necessidade de trabalhar, no momento, é maior.
Vemos nas escolas que implantaram esse projeto um número reduzido de alunos, pois matricula-se apenas quem quer. Imaginem um prédio como o nosso repleto de salas ociosas, enquanto nossos alunos trabalhadores teriam seu acesso à escola dificultado. E mais, alunos que por algum motivo precisam pedir transferência, automaticamente estão fora do projeto, não têm a opção de voltar em momento algum, mesmo que desejem.
É preciso considerar também o número de professores que deixariam a escola, não por incompetência, mas por não poderem cumprir a exigência de se dedicar exclusivamente ao projeto, pois têm compromisso assumido em outras instituições de ensino.
No projeto só permanecerão na escola os profissionais que tiverem competência, todos passarão por avaliação. Porém, sabemos muito bem que na prática não é bem assim que as coisas funcionam. Quem serão os avaliadores? Quais serão os critérios para a escolha dos avaliadores e dessas avaliações? Será que esses critérios serão rigorosamente seguidos? Além disso, com a falta de professores que há no momento, qualquer um será aceito, tendo competência ou não.
Para que não haja dúvidas em relação à seriedade na contratação de profissionais para serviços públicos, temos de passar por concursos, e o governo paulista está simplesmente ignorando essa norma, o que gera falta de transparência nas contratações de professores e gestores para atuarem no projeto; e ainda manda para outras escolas professores aprovados em concursos que estão há anos na mesma escola.
A Câmara Municipal pediu, como está publicado em um jornal local, que o Dirigente Regional de Ensino fosse dar explicações sobre o fato de duas escolas terem rejeitado a implantação do projeto. Quem deve dar explicações é a comunidade escolar (pais, alunos, professores, gestores), pois ela teve autonomia para avaliar a proposta e analisar se era ou não viável à sua realidade, pelo menos nesse ponto nosso governo foi coerente.
Eu, como professora da E.E. Dr. José Manoel Lobo, teria o maior prazer de dar esclarecimentos sobre esse e sobre vários outros assuntos que envolvem a nossa e outras escolas públicas, como o desafio de estimular alunos sem autoestima, sem expectativas para o futuro, de conscientizá-los sobre os malefícios das drogas e do álcool, de oferecer uma estrutura básica de cidadania a alunos que não possuem uma estrutura familiar que cumpra esse papel, de trabalhar em salas de aula lotadas, extremamente quentes, pois nos dias de muito calor, comuns em nossa região, ventiladores não são suficientes e muitas vezes nem eles suportam, queimam por ficarem muito tempo ligados. Sem contar que em plena era da tecnologia digital ainda temos como principais recursos didáticos a lousa, o giz e a voz. Para enfrentar esses desafios, melhorar as condições de trabalho e beneficiar “todos” os alunos de uma escola inclusiva, democrática, garantindo a qualidade da educação não há projeto.
Lutamos por valorização e salários melhores sim, mas não somos a favor de oferecer um ensino de qualidade a uma minoria de alunos e uma melhor condição de trabalho a uma minoria de professores. Queremos o melhor para todos os envolvidos no processo educacional, não aceitamos projetos que propõem alguma forma de exclusão.
*Jussara Silveira Cardoso de Leão é professora efetiva da rede estadual de ensino há 20 anos, aprovada em dois concursos e há 10 anos lecionando na E.E. Dr. José Manoel Lobo