Na virada do ano milhões de brasileiros jogaram flores a Iemanjá, consultaram os búzios ou cartas de tarô, pediram para a cigana ler as suas mãos. Tudo para saber o que o destino reserva para 2017, se as suas vidas passarão pelo mesmo sufoco de 2016 ou se há sinais de que vai melhorar.
Nunca as divindades foram tão consultadas como agora, tal o mar de incertezas sobre o ano que se inicia.
As previsões vão do apocalipse da “dilmização de Temer” ao otimismo cauteloso, segundo o qual, apesar dos raios, trovões, tempestades e terremotos, ao final do ano Michel Temer ainda residirá no Palácio da Alvorada em um ambiente mais favorável na economia e na política.
A singularidade de 2017 é ser um ano-sanduiche. De um lado, dá continuidade a 2016, com toda a sua pauta negativa, de outro, está imprensado pela agenda de 2018, com as forças políticas agindo para ocupar posições para a sucessão presidencial.
Ou, em outras palavras, é o ano da transição da transição, se essa for entendida como a construção das bases necessárias para o Brasil passar de um país desestruturado pela era lulopetista para o advento de um novo modelo de bases mais sólidas, institucional e economicamente. A consolidação de tal modelo será uma missão dos pós 2018.
Esse caráter do ano em curso aparece com nitidez na área econômica, onde fatores positivos e negativos se combinam. Ao final do ano, o crescimento será raquítico, o desemprego continuará sendo um tormento na vida dos brasileiros e a dívida bruta chegará a 76,2% do PIB.
Mas é preciso levar em conta a movimentação das placas tectônicas da economia. A política macroeconômica pode começar a dar resultados. A inflação de 2016 ficará no teto da meta. Sua tendência aponta para uma aproximação para o centro da meta, em 2017. Ou seja, estarão dadas as condições para uma queda consistente da taxa básica de juros.
As medidas microeconômicas adotadas em dezembro podem surtir efeito no médio prazo, principalmente se Temer conseguir destravar as privatizações e se a recuperação em marcha dos preços das commodities tiver continuidade.
Vista em estado neutro, a tendência é de uma melhoria do ambiente e de um horizonte no qual o Brasil rompa o círculo de ferro do baixo crescimento com inflação e juros altos.
Como a economia não é um estado neutro e sofre a incidência do mundo da política, o presidente vai precisar de muita reza brava, banho de cheiro e proteção dos orixás para se livrar das duas espadas de Dâmocles que pairam sobre a sua cabeça; o julgamento das contas de Dilma e Michel Temer pelo TSE e o maracanã de delações da Odebrecht, que podem provocar um abalo sísmico no mundo da política formal e no seu governo.
O fim do mundo de Temer pode não acontecer. Aliás, o mais provável é que não aconteça. Sua margem de manobra não se esgotou.
No dia dois de fevereiro, quando os baianos vão ao Rio Vermelho festejar Iemanjá, dará início à sua reforma ministerial, que pode servir tanto para acomodar insatisfações latentes em sua base de sustentação como para lhe dar condições de fazer política também para as ruas; como, apropriadamente, reivindica o governador de Pernambuco, Paulo Câmara.
Por falar na terra do frevo e do maracatu, os profetas do apocalipse deveriam ler a entrevista do sociólogo Marcus Melo sobre o equívoco da tese da “dilmização de Temer”.
O Congresso é hoje a grande casamata do presidente. Até por uma questão de sobrevivência, Executivo e Legislativo devem atuar em dobradinha em torno de uma agenda positiva, o que, indiretamente, favorecerá o ambiente econômico, com a aprovação das reformas da Previdência e outras medidas.
A cigana pode ter enganado quem aposta em 2017 como o ano do inferno astral dos brasileiros. Os astros podem nos ajudar.
Portanto, desde já, um bom ano novo a todos.