Dilma Rousseff não é a governante dos meus sonhos, mas eu não caio nesse engodo que é essa movimentação contra o governo dela. Concordo com Mário Magalhães quando diz que existe um indisfarçável parentesco entre 1964 e 2015: a disposição de afastar governantes eleitos pelo voto popular. É só isso que anima essa manifestação.
Se esse movimento fosse sério, esses manifestantes não estariam batendo panela somente contra a presidente, e sim contra o governador Geraldo Alckmin, que deliberadamente mentiu sobre a situação das reservas de água em São Paulo e piorou a crise hídrica (e a Sabesp enquanto isso dando água com desconto a rodo para grandes empresas).
Se esse movimento fosse sério, saberia que a corrupção não começou nem piorou com o PT. Entre os alvos estariam Renan Calheiros, Eduardo Cunha, Edison Lobão, Romero Jucá e outros eternos do Congresso, todos citados na Lava-Jato. Ou melhor ainda, a indignação se daria contra os que nem investigados são, como os já esquecidos casos do mensalão mineiro e da Alstom.
Se esse movimento fosse sério, lutaria não somente para punir este ou aquele político ou partido, mas denunciaria as estruturas que criam condições para a corrupção, como o poder econômico e a influência de empreiteiras, bancos, e do agronegócio nas eleições (lembrando que os integrantes da CPI receberam doações de campanha de empresas acusadas na Operação Lava Jato).
Se o movimento fosse sério, pressionaria por uma lei que regulamente a imprensa, para retirar o jornalismo das mãos de um punhado de oligarquias que controlam com mão de ferro o que vira notícia no Brasil (e assim escrevem esse enredo de ficção onde a Dilma aparece como a Geni dos males do Brasil).
Enfim, concordo com Laura Capriglione quando diz que os que agora querem linchar a Dilma (e que já pedem por impeachment desde o dia seguinte às eleições) são os mesmos que se opuseram à regulamentação da profissão de empregada doméstica, que reclamaram dos aeroportos cheios de gente que passou a poder viajar de avião, que desceu o cacete contra o “Mais Médicos”, que acha que o Bolsa-Família é coisa de safado (mas defende mordomias para o alto escalão). E eu poderia acrescentar: que é contra a implantação de faixas de ônibus, que rugiu contra as faixas para ciclistas, que acha que metrô atrai gente diferenciada. Não marcho junto com essa gente.
PS: Vários bons colegas meus notaram que, no dia da Mulher, as injúrias proferidas contra Dilma não questionavam sua competência ou honestidade como governante, mas sua figura como mulher: “vaca”, “puta”, “vagabunda”, etc.
PS2: Para os que defendem a ditadura militar e desconhecem a História: 31 dos 49 nomes da lista da Lava-Jato enviada ao STF são do Partido “Progressista” (partido dos abjetos Paulo Maluf e Jair Bolsonaro), descendente direto da Arena, o partido de sustentação da ditadura.