À exceção de uma ou outra reunião familiar, ou de amigos, em que muito provavelmente boa parte do tempo será gasta em falar mal da vida alheia, vivemos uma sociedade que faz festa apenas para ostentar o consumo. Uma sociedade que festeja o consumo pelo consumo. E só.
Uma sociedade que, sem dúvida alguma, alcançou - e alcança, renovadamente - indiscutível sucesso em incutir em cada um dos seus integrantes a ideia de que ter mais e mais - e não apenas ter -, é fundamental: e, se você não ostenta, você não conta. Sequer olharão para você e esse seu carrinho aí; ou esse apartamentinho - que bairro é mesmo? Ah, sei -; ou essa sua camisa - de três anos atrás! Meu Deus!
O mundo, hoje, alucina. Vive-se para produzir, a baixíssimo custo - a qualquer custo -, e a vender pelo maior lucro, e não importa quem ou o quê fique entre uma ponta ou outra: segue o jogo!
E sem árbitro.
Uma onda compressora subjuga todos e cada um de nós e nos remete sempre e sempre - e de volta - ao universo paralelo que habitamos há, seguramente, uma década pelo menos: a alucinada terra dos que têm que ostentar.
De uma forma ou de outra, e mesmo inconscientemente, somos todos tragados, moídos, diluídos e descartados ao final. Todos, mesmo o Kaiser, serão descartados, ao final.
Um processo doloroso e cruel, desenvolvido apenas para enriquecer alguns, sem qualquer outro ganho humano; sem qualquer outro acréscimo à cultura, à arte, à humanidade, ao desenvolvimento humano.
Em nenhum momento, ou em parte alguma, da sociedade mundial que presentemente erigimos, vê-se pessoas verdadeiramente felizes - ou apenas felizes -; ou superficialmente felizes - que seja -: todos correm vorazes e furiosos, o tempo todo, contra o tempo, para ganhar mais, acumular mais, ter mais e, claro, o fundamento de toda a loucura: mostrar que têm, e, portanto, podem impor-se.
Exatamente igual, em essência, a qualquer grupo de orangotangos.
Valores de convivência humana; morais, éticos, tornaram-se absolutamente inúteis na saga que vivemos - o foco é apenas um: ter o máximo, o verbo máximo.
E tudo o mais, a reboque.
Pessoas infelizes levantam-se todos os dias para cumprirem a mesma e infeliz rotina que detestam, em trabalhos que odeiam e pelos quais sacrificam suas almas, para manter as suas vidas - inteiras -, financiadas; ou mesmo a camisa de três anos atrás, financiada - Ai, meu Deus!:
Vive-se de futuro - um futuro que nunca chega, nunca chegará, porque amanhã serão necessários outros códigos de consumo, outras hipotecas - e joga essa camisa fora, pelo amor de Deus! -, para fazer frente aos códigos de poder.
Uma sociedade doente, que produz pessoas doentes. E só.
Ao fim e ao cabo, é só isso. Não estamos construindo nada de realmente belo e duradouro.
E a notícia terrível é que os orangotangos estão em franca extinção.
Sempre há um predador; às vezes, onde menos imaginávamos.
É realmente cada vez mais densa e escura essa floresta que criamos.