O Brasil é lugar estranho. Incapaz de cometer erros novos. Apenas repetimos os velhos. Tropeçamos repetidamente nas mesmas pedras. Acreditamos nos mesmos contos. Sofremos os mesmos golpes. Acreditamos nas mesmas mentiras. Contadas pelos mesmos mentirosos.
Talvez somente essa nossa credulidade atávica explique como conseguimos chegar até onde chegamos. E dar sentido a nossa capacidade de conviver com a ressaca pós olímpicos. E assistir moribundos elefantes brancos concentrados em grande cemitério à espera do abandono, da obsolescência, seguida de morte certa, dolorosa e cara.
Pudera. O urbanista que planejou os prédios, condomínios, shoppings, e ruas provavelmente achava que gente atrapalha. No chamado legado olímpico, tudo é feito para ser inacessível. Ali, sem carro, não se vai. E, sem muito dinheiro, não se fica. Escolha curiosa para uma cidade que sempre se orgulhou da hospitalidade e do contato humano.
Os shoppings, privilegiam exclusivamente o acesso por carro. E cobram caro por isso. São belíssimos por dentro. E vazios. Com lojas cuidadosamente embelezadas, esperando um povo que não vem. E que, pior, não pode ir. Mesmo assim, teimosamente, os preços permanecem caros. Até para o padrão de primeiro mundo.
Os restaurantes, de fazer inveja a qualquer um, estão escondidos, inacessíveis, portanto, vazios, em cidade onde se vive assustado, com medo. Hoje em dia, nem quem vive onde vida na rua existe, procura ficar em casa, protegido, seguro, na medida do possível.
Neste cemitério, os elefantes brancos longe de olhares curiosos. Tudo fica isolado, longe. No legado olímpico, gente não vai. Na rua não se anda. Não existe esquina, boteco ou alegria. Somente um bairro recém construído e já isolado, desprovido de vida. Em que placas de “aluga-se” unificam a paisagem desolada, pontuada de lindos prédios com salas comerciais desocupadas.
Não bastasse, o Rio não entrou para o circuito mundial do turismo. Os hotéis inaugurados com base no sonho olímpico sofrem com a capacidade ociosa. Sofrimento tão doloroso quanto inútil.
Não existe mesmo razão para visitar a cidade olímpica. É onde se vive a dor de já não ser e a vergonha de já ter sido. Sem, contudo, a coragem de encarar de frente as proporções olímpicas do erro.
O delírio olímpico morre de morte morrida, lenta e sofrida. Sem estrondos, mas com suspiros. Morre sem foguete, sem retrato e sem bilhete. Sem luar, sem violão. Apenas assiste, triste, a metamorfose do legado em cicatriz.