Antonio Rocha Bonfim (Foto: Divulgação)
O nome não importa. Mas, para fazer jus à pessoa, poderia ser: Arrogante Cruel e Prepotente. Seria leviano afirmar que suas ignomínias tiveram início no berçário, entretanto, tornou-se visível e perceptível – exceto para os pais, claro -, ainda na infância, sua inclinação para humilhar as pessoas, seu comportamento pautado por uma inexplicável e fremente necessidade de pisotear os semelhantes.
O nome, de fato não importa, no entanto, para termos uma referência e usar de coerência para com o perfil do homem – personagem central de nossa história -, ele passa a receber um nome: Ignóbil.
O pai de Ignóbil era um homem vil e viu com indisfarçável orgulho que sua vileza fora superada pela do filho. Este ascendeu meteoricamente – ascensão brilhante, porém efêmera. Sob o olhar pleno de contentamento do pai, Ignóbil progrediu em torpeza e deslealdade. Tornou-se um homem frio, privilegiava o ter em detrimento do ser e desprezava sobremaneira a retidão de caráter.
Desde os tempos do colégio, Ignóbil apreciava o exercício de humilhar outras crianças, e assim cresceu, transformando-se em um arrogante profissional. Pisoteava pessoas e trapaceava com inarrável satisfação e brilho nos olhos. Só uma coisa lhe proporcionava mais contentamento que o sofrimento alheio: causar tal sofrimento.
Aos vinte anos de idade, Ignóbil abriu uma pequena empresa em sociedade com um amigo. Eram ambos criativos. A empresa progrediu e cresceu com surpreendente rapidez. Alguns anos depois, numa manobra típica dos calhordas, Ignóbil traiu o sócio, aliou-se à concorrência e ganhou seu primeiro milhão. Posteriormente aplicou um golpe nos novos aliados e faturou cinco milhões. Seguiu trilhando esse caminho de canalhas. Fez fortuna. Foi convidado a participar de altas rodas e sociedades secretas.
“A velha história de que a fé remove montes não passa de conto da carochinha, balela, verborragia criada com o intuito de manipular o povo”, dizia Ignóbil, “mas, supondo que a fé de fato remova montes, ela, a fé, tornou-se obsoleta em 1886, quando o sueco Alfred Nobel inventou a dinamite, esta possibilita a remoção de montes sem a necessidade de fé ou nenhuma outra fantasia equivalente.”
Ignóbil filiou-se a um Partido político, lançou sua candidatura, recebeu expressiva votação e foi eleito. Agora podia potencializar seu poder, o poder de um homem que pode elaborar e discutir leis capazes de impactar a vida de milhões de pessoas.
“Salve a ousadia e abaixo a fé, homens produtivos são homens de ação, parabéns, meu caro”, disse Ignóbil no dia da posse, olhando para o espelho.
Ignóbil logo passou a ser visto como um exemplo a ser seguido, um homem com determinação ferrenha que escreveu uma história de inegável sucesso: dinheiro, poder e fama. O ofício de Ignóbil: manipular pessoas e administrar um império. O prazer: humilhar subordinados e quem mais cruzasse seu caminho.
Em um domingo ensolarado, Ignóbil estava em uma de suas mansões. Depois de consultar alguns dados das empresas, deixou o escritório, vestiu-se apropriadamente e encaminhou-se à piscina. Foi então que sentiu forte dor no peito, como se recebesse uma pancada, depois um golpe na cabeça. Foi ao solo e viu as indiferentes e leves ondulações da água cristalina. Os seguranças correram para ajudá-lo, mas era tarde demais. Ignóbil ficou desfigurado. Continuou a receber golpes de todos os bumerangues que atirara ao longo da vida e que agora retornavam. Morreu cercado por uma profusão de bumerangues que só ele podia ver.
Era o fim do império de Ignóbil. E o início de seus problemas.
Antonio Rocha Bonfim é romancista, contista, poeta, compositor, letrista, intérprete e colunista deste jornal