Antonio Rocha Bonfim (Foto: Divulgação)
Ele: Amaro Pacífico. Ela: Mara Valente.
Ele: Pacífico e afável. Ela: Valente e beligerante.
O fato: Amaro amara Mara assim que a vira à beira-mar.
Aliteração à parte, Mara desfilava graciosa e displicente pela praia de areia alva. Alva, mesmo, embora pareça mentira, a verdade é que não havia na areia sequer vestígio de mancha de óleo.
Era fim de tarde e o coração de Amaro disparou. Mara percebeu que era observada por Amaro, sentiu um leve arrepio e sorriu. Amaro também sorriu e, pronto, nasceu o amor entre ambos. Ou melhor, o amor entre eles nascera em tempo imemorial e, aquela tarde, na praia, fora revelado para o casal.
Amaro e Mara se casaram. E escreveram poesia a quatro mãos para celebrar o amor e retratar o tempo em que eram crianças.
Ele: “Eu já fui mais que poeta, fui poesia. Chorava como chora a poesia, e corria livre e tudo podia. E sorria e brincava como sorri e brinca a poesia...”
Ela: “Eu já tive na face duas musas. Musas-brilhantes, musas-meninas – esperançosas musas. Eu já fui mais que poeta. Fui menina. E com você, voltei a ser...”
Ele e ela: “Eu já fui mais que poeta, fui poesia, e não sabia. Hoje desenho com palavras, o retrato do que fui. E com você, voltei a ser!”
Doaram-se e descobriram – como fazem as crianças – a natural leveza de viver. E encontraram a felicidade um no outro e ele sempre levava flores para a amada. Mas, um dia ela disse:
“O que importa, mesmo, é o nosso amor, não há necessidade de tantas flores.”
Ele discordou, mas calou-se. E por um tempo deixou de levar as flores.
Comiam pipoca diante da TV quando ele disse:
“Você ilumina minha vida.”
“Isso não é letra de música antiga?!”, ela indagou, “You light up my life ou coisa assim, Debby Boone?”
“Mas eu nem conheço a música em questão”, defendeu-se ele, “você ilumina minha vida, mesmo, além do mais, o que diz respeito ao amor, seja a letra de uma canção, uma carícia ou qualquer outra forma manifestada pela via do verdadeiro sentimento jamais fica antigo; o amor não é antigo nem moderno, ele simplesmente é.”
Tempos depois, ele surgiu novamente com um buquê de rosas. Entregou as flores a ela e disse: “eu te amo.”
“O que foi que você andou aprontando?”
“O quê?!”
“Não tente me confundir nem ganhar tempo, estou falando das rosas, isso é típico de quem tem culpa pesando na consciência.”
“Mas que absurdo! O buquê é apenas uma demonstração de carinho e amor.”
Na semana seguinte, ele entregou a ela uma caixinha com delicados doces.
“Você quer que eu engorde!”, ela exclamou, “qual é o plano agora?”
“Não há plano, fique sossegada, não trarei mais flores nem doces nem nada.”
Então ela começou a atrasar o relógio de parede e acusar Amaro de chegar atrasado e criar motivo para brigar. E começou a acusá-lo de ausência de gestos carinhosos, como presenteá-la com flores ou chocolate.
E o amor de Amaro e Mara continua a brilhar – quente e perene -, como o sol de fim de tarde que aqueceu seus corações e uniu suas almas, à beira-mar.