Tony Rocha (Foto: Divulgação)
Há décadas, Olegário Natalino da Luz ia, todas as manhãs, à mesma praça. Cumprimentava e era cumprimentado por transeuntes, descansava sentado à sombra de alguma árvore e olhava o movimento preguiçoso dos pombos. Mas aquela manhã – uma bela manhã às vésperas do Natal – era especial.
Olegário não via uma manhã como aquela há cerca de meio século. Fechou os olhos e mergulhou no passado. Voltou à infância feliz de menino do campo que corria livre pelas planícies banhadas pelo sol matinal. Experimentou a terna sensação de reviver as brandas manhãs de outrora.
Além de agradável, harmoniosa e formosa, a manhã imprimia prazer e admiração aos corações. Havia uma grande taça azul em tom claro e suave emborcada sobre a praça, uma taça que se estendia até a linha do horizonte. Quando Olegário abriu os olhos, viu grandes flores azuis em uma sibipiruna cujas flores, como se sabe, são amarelas e pequenas. As flores azuis eram fragmentos dessa taça que apareciam nos espaços vagos entre galhos e folhas da sibipiruna. Luz via pedaços de céu.
Um homem se aproximou de Olegário e o cumprimentou:
“Bom-dia, cavalheiro.”
Olegário não reconheceu o homem, mas retribuiu ao cumprimento:
“Bom-dia, senhor.”
Então o homem sentou-se ao lado de Olegário e prosseguiu:
“Uma manhã verdadeiramente bela, eu olhava à distância, e notei que o cavalheiro apreciava as grandes flores azuis.”
“O quê?!”
“Eu disse que notei que o cavalheiro apreciava as grandes flores azuis.”
“Ouvi o que disse, mas... como sabe que eu estava vendo grandes flores azuis?”
“Senhor Olegário Natalino da Luz, eu...”
“E como é que sabe meu nome, nós nos conhecemos?”
“Sim, eu o conheço desde sempre, e você também me conhece, Olegário.”
Olegário ficou calado por um momento. Era mesmo possível que se conhecessem; amigos de infância, talvez.
“Mas eu estava vendo grandes flores azuis em uma sibipiruna cujas flores são amarelas e pequenas, como é que teve tal percepção?”
“Por um momento você voltou a ser criança, por isso viu as grandes flores azuis, todas as árvores são árvores de possibilidades, porque árvores são vidas, coisas que são inacessíveis aos sábios e instruídos lhe foram reveladas; crianças são autênticas e transparentes, recordei minhas próprias palavras: deixai os pequeninos, não os embaraceis de vir a mim, porque deles é o reino dos céus.”
“Mas... quem é você, afinal?”
“O caminho, a verdade, a vida... a essência.”
“Espere um pouco, você é... Você é Jesus?”
“Sim, eu sou Jesus, o Cristo.”
“Então... Você finalmente voltou?”
“Eu sempre estive aqui, sou a luz que brilha no interior dos homens de boa-vontade enquanto as luzes de Natal enfeitam as ruas, praças e vitrines. Todo dia é Natal, porque todo dia, em algum lugar, a esperança nasce com uma criança e o amor brota em algum coração.”
Antes de prosseguir em sua caminhada, o homem disse: “Feliz Natal.”