Tony Rocha (Foto: Divulgação)
O nome bem que podia ser Mosaico de Nações. Usava gravata italiana, sapatos alemães, terno francês etc. E no etc. havia apenas aparências. Se lhe tirassem a camada de verniz ficaria apenas um banal e desolador homenzinho de isopor – sem o menor vestígio de sentimento nobre, regra de etiqueta ou elegância.
Ordenou aos seguranças que fizessem uma varredura em seu gabinete. Temia os perigos por que todos os chefes de Estado estão diuturnamente sujeitos: de grampos arquitetados e plantados pela oposição a bombas que poderiam mandar pelos ares – ou pro inferno – sua ordinária e mísera vida que, equivocadamente, julgava importante.
A equipe encarregada da segurança passou minucioso pente fino no gabinete e nada de estranho foi detectado. A equipe liberou a entrada do chefe de Estado que, uma vez no gabinete, usou o interfone para autorizar a entrada de seu ministro da Economia.
“A Economia é capaz de manter qualquer governo em alta aprovação popular”, disse o ministro, “já que a parte mais sensível do homem é o bolso.”
“É verdade isso daí, precisamos mostrar números positivos da Economia.”
“A palavra de ordem, e da moda, é: empreendedorismo”, disse o ministro, que também era de isopor, além de frio, “o povo não consegue sequer pronunciar a palavra empreendedorismo, aliás, acho que esse palavrão nem tem registro em língua portuguesa, mas, a verdade é que, se um desempregado começa, por exemplo, a vender pão caseiro na rua, ainda que venda apenas um pão por semana, transforma-se em empreendedor e sai do rol dos desempregados, o que gera números positivos na Economia, já que aponta queda do desemprego.”
“Muito bom isso daí”, disse o chefe, “não entendo muito de Economia, essa tal de renda per capita, o que é isso daí?”
“É o resultado da divisão da renda de um país pelo número de seus habitantes.”
“Então, se metade da população morrer, a renda per capita melhora.”
“Genial! Se metade da população morrer, a renda per capita dobra, e em termos de Economia, isso seria um número inegavelmente positivo.”
“Então vamos implantar esse plano daí.”
“Mas... isso diminuiria a disponibilidade de mão-de-obra, e é a mão-de-obra que produz riqueza.”
“E os desempregados e aposentados? Eles já não estão produzindo riqueza mesmo.”
“Mas o senhor é um gênio! Além do mais, desempregados não contribuem com a Previdência, derrubaríamos o gasto previdenciário, já que mortos não se aposentam.”
“Aí depende, podemos dizer que os mortos se aposentam definitivamente.”
“Genial e espirituoso! Precisamos de uma estratégia, um plano de ação, infelizmente, não é possível sair por aí matando as pessoas, isso não pegaria muito bem, poderia arranhar a imagem do governo, e a vigilância não dá tréguas hoje em dia.”
“Então vamos criar clima e condições para que as pessoas se matem.”
“Seria ótimo, mas como faremos isso?”
“Atacando em várias frentes”, disse o chefe, orgulhoso de si, “flexibilizando as regras para a posse de arma de fogo, contribuindo para que o trânsito se torne mais violento, criando um clima de animosidade e incentivando o confronto etc.”
“Bravo, bravo, impressionante sua capacidade de solucionar problemas, com todo o respeito, idiota é quem diz que o senhor é idiota.”
“Agora fiquei na dúvida, não sei se lhe demito ou se agradeço isso daí.”