A divulgação dos resultados do último Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) acendeu um alerta sobre os Anos Finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano). Dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) mostraram que essa fase foi a única a apresentar queda no desempenho, com nota caindo de 5,1 em 2021 para 5,0 em 2023 - a meta era 5,5. Além disso, a recente avaliação internacional TIMSS (Tendências em Estudo Internacional de Matemática e Ciência) revelou que apenas 38% dos alunos brasileiros do 8º ano atingiram o nível mínimo de proficiência, muito abaixo da média global de 91%.
As dificuldades nos Anos Finais não são exclusivas do Brasil; são um desafio global. O TIMSS mostra que o desempenho em matemática e ciências no 8º ano cai em relação aos alunos do 4º ano na maioria dos países. Nessa etapa dos Anos Finais, muitos sistemas educacionais impõem mudanças significativas para um público em transição para a adolescência, que experimenta transformações pessoais intensas. As crianças passam a ter múltiplos professores, ao contrário da única professora de referência dos anos anteriores, com quem tinham mais tempo e vínculo.
O relatório “Perspectivas Internacionais para o Fortalecimento dos Anos Finais do Ensino Fundamental”, elaborado pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em parceria com o Itaú Social, mapeou boas práticas internacionais. Uma das principais recomendações é a escuta ativa dos estudantes, destacada em países como Costa Rica, Portugal, Irlanda e Dinamarca. Na Costa Rica, os “Diálogos Nacionais de Estudantes”, realizados anualmente, oferecem uma plataforma para que os alunos participem da formulação de políticas educacionais, promovendo impacto positivo no desempenho e na motivação dos estudantes.
No Brasil, iniciativas como a Semana da Escuta das Adolescências nas Escolas, parte do Programa Escola das Adolescências, mobilizaram 2,2 milhões de adolescentes em 2023, promovendo a participação ativa dos estudantes na construção de uma educação mais inclusiva.
Além disso, o estudo da OCDE destaca a importância de ambientes escolares que promovam pertencimento e segurança. Segundo o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), de 2022, escolas resilientes fortalecem as relações entre alunos, professores e famílias, criando ambientes acolhedores. Um bom exemplo vem da Colômbia, com o SIUCE (Sistema de Información Unificado de Convivencia Escolar), uma plataforma que integra registros de situações sensíveis, como gravidez na adolescência e problemas de convivência, permitindo ações preventivas.
Outro desafio apontado pela OCDE é a taxa de repetência. No Brasil, um em cada cinco jovens de 15 anos afirmou já ter repetido um ano escolar, de acordo com dados do PISA 2022. A Espanha, por exemplo, tem implementado programas que atuam diretamente com estudantes vulneráveis, oferecendo suporte adicional e promovendo a inclusão. Esses modelos podem servir de inspiração para o Brasil, inclusive para a redução dos índices de abandono escolar.
Programas que apoiem na transição dos Anos Iniciais para os Anos Finais do Ensino Fundamental também contribuem para a melhoria dos indicadores educacionais. Na Espanha, uma lei nacional, em vigor desde 2021, determina a entrega de relatórios personalizados dos principais objetivos de aprendizado dos estudantes em transição entre a educação primária e secundária. O sistema de ensino do país também eliminou hierarquias de disciplinas e testes obrigatórios, promovendo uma transição mais suave. Em 2023, redes municipais e estaduais no Brasil começaram a desenhar e implementar estratégias de transição em estados como Alagoas e Mato Grosso. O programa nacional Escola das Adolescências também inseriu um eixo de formação e apoio técnico para as redes focado nesse tema.
O relatório da OCDE recomenda ainda que os sistemas educacionais incentivem as aspirações profissionais dos alunos. No Brasil, 29% dos jovens não têm uma ideia clara sobre seu futuro profissional, acima da média de 25% dos países da OCDE. No Canadá, um programa integra a educação sobre carreiras no Ensino Fundamental, promovendo consciência sobre o mercado de trabalho e utilizando uma plataforma digital que apoia estudantes, professores e famílias.
Os resultados das avaliações no Brasil indicam que ainda há muito a ser feito para os Anos Finais, e a inspiração em boas práticas internacionais pode ser um caminho para buscarmos melhorias. Mas, igualmente importante será aprendermos com estados e municípios que assumiram essa etapa, antes esquecida, como prioridade. O início dos novos governos municipais, responsáveis por metade das matrículas dos Anos Finais, é uma boa oportunidade para se avançar ainda mais neste sentido. É mais do que chegada a hora das adolescências serem reconhecidas como uma etapa em que a vida escolar pode ser construída com muita alegria, acolhimento, descoberta e aprendizados para todos e todas.