Em contexto no qual foi lançado, pelo Ministério da Educação, o Programa Nacional Alfabetização na Idade Certa, programa integrado que objetiva alfabetizar 100% das crianças, até o 3º ano do Ensino Fundamental, estamos vivendo, na outra ponta, a greve nas instituições federais de ensino.
A inteligência e o afeto de todos os colegas sensíveis ao tema da educação e que pensam de forma complexa a realidade social encontram-se perplexos. A perplexidade resulta da combinação de algumas realidades bem conhecidas. Em primeiro lugar, parece que nenhum representante eleito duvide de que a educação é o único caminho capaz de construir a verdadeira revolução politica que faz falta à nação e ao povo brasileiro. Em segundo lugar, a falta de investimento para que isso aconteça também é evidente. Em terceiro lugar, o conhecimento de que não faltam ao país os recursos econômicos para tal feito. Em quarto lugar, a consciência imediatista de nossos representantes que manifestam habilidades de pensar estratégias pontuais somente para curtíssimo prazo, no caso o prazo capaz de garantir seu mandato também imediato.
E as perguntas se impõem: é isso falta de vontade política? A quem interessa permanecer assim? E a sociedade civil tem interesse nessa revolução a partir da educação? Ou também somente manifesta interesses locais, pontuais e imediatistas? Confesso que nossa tentação é afirmar positivamente a estas questões. Isso tudo confirma o quanto a revolução é imprescindível, pois falta consciência politica, falta espírito republicano, falta democracia substantiva.
Como construir um pacto se somente uma pequena parcela de um dos lados manifesta a consciência e o desejo? Estamos falando dos educadores envolvidos no processo, que cotidianamente vivem a tensão de humanizar o animal homem, de lapidar a alma humana para a sociabilidade.
Negar o investimento solicitado e absolutamente necessário é voltar-se contra a cultura humanizante, é atitude impulsiva, passional e refém de interesses que caminham na contramão do Estado Democrático de Direito. E a perplexidade e a indignação de nossa inteligência e de nosso afeto revelam-se mais uma vez na interrogativa: como é possível haver governantes ou eleger representantes sem nenhum espírito republicano?
Analogamente a essa democracia neoliberal, o regime totalitário também não investe em educação, pois seria dar um tiro no coração do sistema. Será que há algo similar acontecendo em nossa democracia representativa? Como despertar a democracia participativa? Como suscitar o movimento pela emancipação social? Como reinventar a cultura democrática e republicana se não for pela educação?
Há uma experiência brasileira internacionalmente conhecida e muito elogiada: o orçamento participativo. Verdadeiramente, o orçamento participativo é belíssimo exemplo de democracia participativa. Contudo, olhando para as propostas de investimento dos recursos do orçamento, quais são os critérios para definir o encaminhamento dos recursos? Será que o povo tem condições de pensar em investimentos em educação quando outros direitos sociais relacionados à simples sobrevivência ainda não estão garantidos. Devemos exigir diretamente do povo a responsabilidade pelo investimento em educação? Quando o imediato é garantir a sobrevida material, normalmente fica postergada a preocupação com a evolução espiritual. Permanece, assim, a educação sempre ausente, pois o resultado parece não ser imediato. Dizemos parece, pois efetivamente haverá resultados imediatos a partir do momento em que crianças, adolescentes e jovens não estiverem andando pelas ruas, mas assistidos com projetos verdadeiramente educativos.
Acreditamos que a solidariedade para com as crianças que estão nascendo e com as futuras gerações, que passa pelo investimento em educação, deverá ser suscitada e alimentada pelos múltiplos mecanismos democráticos existentes em nosso país, especialmente através da liberdade de imprensa que vem ao encontro do direito à informação.
Ora, as eleições se aproximam. Renasce a esperança de que o exercício do voto, direito e dever do cidadão, possa ser método para escolher os candidatos que publicamente assumirem o compromisso com a revolução politica através da educação. Aliado aos instrumentos da mídia, o povo-cidadão tem a oportunidade da informação e da força mobilizadora para reinventar a democracia e construir o Estado de bem-estar social.
*Celito Meier