Quero começar dizendo que falta o verdadeiro sentimento de vida nas pessoas, mas eu não tenho a resposta. Talvez, ninguém tenha.
A perfeição que almejamos é uma clássica utopia. Ainda que o mundo perfeito não seja possível, a verdade é que sinto que tem algo de muito errado no mundo em que vivemos. Tirando uma rara minoria sábia que entende que está aqui para viver, o que vejo são milhões de formiguinhas desorientadas, perdidas de seu formigueiro.
As pessoas vivem automática e roboticamente vidas insossas, elegem uma série de deveres, necessidades e até sonhos que não são seus. A busca pela segurança é uma preocupação forte do nosso tempo e o maior objetivo da grande massa perdida. Mas por que essa obsessão pela segurança? Se a vida é única, preciosa e esplendorosa, como nosso maior foco pode ser nos protegermos de viver? Vale mesmo não arriscarmos nada em nome de uma velhice tranquila, nem nosso sonho mais querido?
Os antigos gregos tinham outra forma de compreender a vida. Eles sabiam que era para ser vivida prazerosamente e preferiam uma vida curta e marcante àquela longa e monótona. Em sua sabedoria eles desfrutavam e não viviam voltados para o dever, tampouco se cercavam com tanta segurança, deixavam a vida penetrar-lhes até a última gota de sangue. A beleza, a música, a arte em toda sua plenitude com seus grandes escultores, poetas e artistas dos mais variados, fazem até hoje nossos olhos ainda se encherem de lágrimas.
Nietzsche que estudou esse povo com profundidade descreveu sua filosofia: “o melhor, em primeiro lugar, é não ser, em segundo lugar é morrer em breve”. Os gregos compreendiam a magnitude da morte, que lhes dava a exata dimensão de que cada dia deveria ser desfrutado da melhor forma possível. Acreditavam que sua existência só seria digna de ser lembrada se vivessem intensa e apaixonadamente, buscando alegria, beleza, inteligência, conhecimento e conquistando aquilo que realmente queriam.
Hoje o valor exaltado pela segurança torna a vida mais cinza, sem graça e, certamente, muito mais chata. Atualmente o desfrute é artigo raro, de luxo e visto injustamente como leviano. Obrigações inúteis são lançadas exigindo o que temos de mais valioso para executá-las: nosso tempo. A arte é descartável, assim como nossos ícones. Faz parte do mundo que escolhemos viver. Afinal, em um mundo em que as pessoas vivem suas vidas sem prazer, em troca da tão enaltecida segurança, que arte poderia agradar? Somente aquela que aliena, retira seus olhos da realidade, amortece a dor da sua rotina degradante e não o deixa pensar.
Como eu disse no início do texto, não tenho a resposta. Não sei como viemos parar aqui. Só sinto em meu âmago que tem algo de muito errado nessa forma de vida que escolhemos, em que aquilo que temos de mais valioso, que é o tempo, é o artigo mais desperdiçado e violentado. Pode ser porque ainda não tenhamos entendido a preciosidade do tempo e estamos correndo demais para pensar. Pode ser porque nos distanciamos demais da vida e da sua realidade. Não sei mesmo. De qualquer forma, é muito triste pensar que somente na velhice as pessoas poderão gozar um pouco de liberdade, mas, então, já lhes restará tão pouco tempo!
Eu queria entender a lógica do nosso mundo, mas quanto mais penso, menos compreendo. Talvez não tenha mesmo qualquer lógica. Eu só sei que falta vida, no sentido pleno. E isso nós podemos mudar. É só não esperar a velhice para viver e ser quem você deveria ter sido.
Eliane Quintella é escritora