*Marcial Carlos Ribeiro é diretor-presidente do Hospital São Vicente – FUNEF, de Curitiba (PR)
A situação dos hospitais filantrópicos brasileiros vai de mal a pior. Altas dívidas bancárias e grandes problemas administrativos compõem o cenário deste serviço que, em teoria, deveria ser exemplo nacional de sucesso.
Em Curitiba, por exemplo, as dívidas bancárias chegam a assustar. O Hospital Evangélico possui cerca de R$ 80 milhões em débitos acumulados. O Pequeno Príncipe, referência nacional em saúde infantil, são R$ 18 milhões em dívidas. A Santa Casa responde por R$ 18 milhões e, o Hospital São Vicente - FUNEF, possui dívida de R$ 7,5 milhões. Isso sem contar os juros que estão sendo pagos que refletem diretamente na qualidade dos serviços prestados à população.
São cinco milhões de reais gastos com despesas mensais em juros bancários apenas em Curitiba. Pense que, se estes valores fossem utilizados na assistência médica de fato, milhares de pessoas teriam acesso facilitado a seu bem maior: a saúde.
Quais os fatores que levam os hospitais a esta situação? A gestão administrativa, sem dúvida, é um deles e precisa ser atualizada, reavaliada em caráter urgente. Isso pode ser feito por meio da execução de ações que evitem o desperdício envolvendo gastos aparentemente menores e que, se não controlados, serão milhares deles no futuro.
Mas o principal fator é de ordem financeira. É de caráter público que o aporte proporcionado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é defasado. Algumas correções pontuais já foram realizadas, porém, de acordo com estudos da Federação das Santas Casas, para cada R$ 100 utilizados para atendimento no SUS, apenas R$ 60 são pagos aos hospitais. Aí está um grande problema, pois isso já inviabiliza os hospitais filantrópicos, pois para se manter filantrópico, 60% dos atendimentos devem ser realizados via SUS. Isso porque a maioria dos hospitais filantrópicos é insolvente.
Neste contexto, existe também o que se chama de “contratualização de hospitais” com o SUS, que possuem critérios próprios de prestação de serviços, prevendo valores a atingir para efetivar pagamentos. O não cumprimento determinaria revisões de pagamento (fato este que já possui atraso). Se este sistema fosse adequado, como explicar a situação dos hospitais citados?
Por outro lado, os critérios “legais” utilizados para o mecanismo de pagamento seriam de 90 dias a 120 dias. Vale considerar que os gastos são feitos mensalmente e o faturamento é encaminhado, normalmente, no início do mês seguinte. Então é fato que existe a auditoria para análise de contas que, em grande parte, não consegue analisar o processo. E assim vai. Com o tempo passando, verbas sem caixa, protelação de pagamentos e os hospitais buscando recursos para saldar os seus compromissos, sobretudo, os relativos a seu próprio pessoal que é inadiável. Com certeza esta é uma das razões básicas de endividamento com seus juros sobre juros correspondentes. Mas o “sistema” dirá que está em dia.
Em casos específicos, os atrasos se devem aos chamados aditivos, que são valores de incentivo a prestações específicas de atendimento a pacientes internados com leitos reservados ao sistema, ou até mesmo ao que se chama porta-aberta, voltados para determinadas especialidades como a cardiologia, mas cujos atrasos são da mesma ordem.
É inaceitável que os pagamentos sejam feitos logo após a apresentação de faturas, pois os contratos firmados apontam que qualquer anormalidade detectada implica em retenção de recursos do pagamento subsequente. Esta é a lógica para proporcionar atendimento qualificado e sobrevivência dos filantrópicos ou seu desaparecimento caso medidas urgentes não sejam executadas.
Imagine se os hospitais filantrópicos, que respondem por dois terços da assistência médica prestada no Brasil, fechassem suas portas? O caos seria o diagnóstico mais preciso. No caso do Hospital São Vicente - FUNEF, foi feita a readequação dos espaços com a retirada de 36 leitos. No Paraná em geral, até dezembro de 2014 foram fechados 5.445 leitos hospitalares. No Brasil, a notícia que se espalha é que centenas de milhares de leitos estão sendo desativados.
Por isso, é preciso rever os critérios, as metodologias de encaminhamento e, principalmente, exigir que os administradores da saúde no país, tenham realmente conhecimento e experiência no setor. Diante desta situação, é inaceitável que este cenário tenha continuidade. Isso porque estamos falando do maior direito do cidadão e da própria lei, como dever maior do estado. Onde estão os nossos parlamentares que não colocam esse tema como prioridade e com urgência pela saúde do povo?
Soluções pertinentes existem. Portanto, é necessário encontrar a solução legal e ideal para o caso dos filantrópicos no Brasil, caso contrário, a calamidade na saúde estará declarada.