Dilma Rousseff se refere agora à Presidência da República como “minha cadeira” – quando aquela “cadeira” é pública, a ninguém pertence. Mas não é disso que vou me ocupar aqui. O sociólogo Gustavo Falcón, autor do excelente “Reformismo e Luta Armada no Brasil”, me leva a detalhar o artiguete onde afirmei que, durante a ditadura militar, Dilma jamais defendeu a democracia no Brasil.
Falcón sabe que Dilma, expert em falsificar fatos, mente sem pudor quando se apresenta como alguém que, entre o AI-5 e os tempos de Médici, foi uma brava militante democrata. Conhecemos a história política de Dilma. Ela criou uma fantasia deliriosa para consumo próprio, bem distante da realidade da esquerda militarista em que se enrascou.
Dilma veio jovem para a esfera de influência da organização “marxista-leninista” Política Operária (onde ficou um semestre na célula da Faculdade de Economia) – a Polop, que considerava imbecilidade essa conversa de “democracia”. Livro-de-cabeceira dos polopianos era “Estado e Revolução”, de Lênin, pregação acesa a favor da destruição do Estado representativo-parlamentar.
Para o Brasil, o programa era unívoco: derrubar a ditadura dos patrões para, em seu lugar, implantar a célebre ditadura do proletariado. A democracia era olhada como manipulação alienada, desprezível. E deveria ser combatida em nome da revolução socialista. Dilma, embora militante sem qualquer relevo (na verdade, naquele arremedo de luta armada, ela nunca foi além da “intendência”), rezava por essa cartilha.
Chegou na Polop no momento do racha da organização, optando então pela facção militarista, que se confinou no Colina – Comando de Libertação Nacional. Adiante, duas vertentes da esquerda armada, o Colina e a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), se fundiram na VAR (Vanguarda Armada Revolucionária)-Palmares. E em todos esses momentos e organizações, “democracia” era palavrão. Mistificação execrável para sustentar a dominação da classe burguesa. O projeto continuava o mesmo: substituir a ditadura militar da burguesia pela ditadura militar do proletariado.
Agora, por que Dilma esconde esses fatos e se dispõe a mentir tão safadamente para o conjunto da sociedade brasileira? Simples: porque hoje fica muito bem na foto quem diz que enfrentou heroicamente a ditadura em nome do princípio maior da democracia. Mas fica mal quem admite que, como os militares, também achava que a solução estava numa ditadura. E Dilma prefere a morte do que ficar mal na foto.