Os onze votos no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar que permitiram a evolução do processo de cassação contra o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, podem significar bem mais do que a simples perda de mandato de um deputado cuja reputação desmorona com impressionante rapidez. Na verdade, a decisão tomada no último dia 14 deste mês pode colocar mais lenha na fogueira que arde sobre o governo do interino Michel Temer.
Desde os episódios do mensalão, que culminou com a prisão de importantes líderes ligados ao governo do ex-presidente Lula, o clima entre os políticos ficou carregado de tensão. Com as investigações da operação Lava-Jato e com a prisão de empresários, políticos e intermediários, a sensação de segurança que permitia a existência de um padrão de relacionamento entre os poderes Legislativo e Executivo deteriorou, levando consigo a governabilidade e a possibilidade de articulação de consensos por meios consagrados. O insucesso na tentativa de compra de apoio à presidente Dilma, por ocasião da votação pela aceitação do processo de impedimento na Câmara, demostrou que o sistema partidário e o sistema político estão em vias de sofrer um colapso.
Hoje, acuado e vendo a sua família se tornar alvo das investigações, Eduardo Cunha se torna um fardo para Michel Temer e seu governo, pois pode, em sua luta por sobrevivência, fazer da chantagem um instrumento de instabilidade ainda maior para um interino que tem de administrar o ambiente interno e dar respostas para a sociedade imersa numa crise econômica e social de grandes proporções.
As especulações sobre o recurso a um possível acordo de delação premiada, ainda que negadas por Eduardo Cunha, sinalizam, para bom entendedor, que uma conta será cobrada. E pode recair sobre Michel Temer, beneficiário momentâneo do afastamento da desafeta do ex-presidente da Câmara, Dilma Rousseff.
Os próximos dias prometem emoções fortes. E a grande política continua sendo um sonho.