*Tânia Fusco é jornalista, mineira, observadora, curiosa, risonha e palpiteira, mãe de três filhos, avó de dois netos. Vive em Brasília.
De novo, o papa Francisco. Sempre ele – e só ele! – a por o guizo no gato, o dedo nas feridas. Dessa vez, rejeitou o simplismo de associações automáticas entre Islã e violência. “Todos os dias quando abro os jornais vejo a violência na Itália. Alguém que matou a namorada, outro matou a sogra, e são católicos batizados”.
Nem só na Itália, nem novidade. O jovem que, aos urros, chamou Letícia Sabatella de puta tem cara e pose de cristão batizado. Boa dezena de nossos conhecidos que sonegam impostos, corrompem, odeiam, desprezam e ofendem seus diferentes, roubam e até são capazes de matar também são batizados. Muitos são também rezadores.
Rezam, passam orações e novenas pelas redes sociais, mas odeiam gente que nem conhecem. Odeiam os diferentes em comportamento, cor de pele, opção sexual, política, e religiosa inclusive.
Rezam nos dias de rezar. Mas são violentos porque são mal educados no sentir. Modelo tamanho desumanizado. Pouco sentimento, muita força bruta – na boca e nas mãos.
E aí vem o recado complementar do papa nesta semana: O terrorismo prospera quando o deus do dinheiro se põe na frente e quando não há outra opção. Quantos dos nossos jovens abandonamos sem ideais, sem trabalho? É, então, quando se voltam para as drogas, para o álcool, e se metem com grupos fundamentalistas.
Direto, o papa Francisco mandou na lata: a Europa está empurrando jovens para o radicalismo, sem trabalho, sem emprego.
Não só na Europa, nem novidade. A importância é o dedo na ferida. Lá e aqui, temos jovens abandonados pelo modelo social vigente e desde a primeira infância.
Muito simplificadamente, são filhos de hoje. De gente que trabalha um mínimo de oito horas diárias e que tem que terceirizar todo o além do trabalho - a criação dos seus meninos e meninas também. Os mais ricos com babás e escolas. Esses são os muito bem assistidos das coisas materiais. E ponto.
Os mais pobres se viram com as escolas que conseguem, e quando conseguem, e como conseguem, e se conseguem.
Como sabemos disso, até pensamos solução possível: escolas de tempo integral para os meninos e meninas mais carentes. Abrigos possíveis, mas que não há governo que consiga fazê-las em número suficiente para abrigar tantos.
Simplificadamente, também sabemos que a maioria dos que sobram – e sobrevivem - vão lotar cadeias. As cadeias são o outro modelo social vigente para enfrentar a violência dos que sobram. Não pensamos soluções, pensamos penas. Os jovens são também maioria entre detentos.
A violência, comandada das cadeias, que vive o Rio Grande do Norte nesses dias, mostra que depósito das sobras sociais resulta em mais violência – terrorismo modelo Brasil, México, Venezuela, etc. que já é parte do nosso cotidiano.
“Europa está empurrando parte de sua juventude para o radicalismo”, cutuca o papa. Radicalismos são sinônimos de violência. Vale para lá, vale para aqui. Vale para os batizados e os não. Muito mais complicado do que essa simplificadíssima escrita. Temos uma sociedade doente que nos amedronta, ameaça e aprisiona em guetos cada vez mais desprotegidos.
“Se tiver de falar da violência islâmica, também tenho de falar da violência cristã. Em quase todas as religiões, sempre há pequenos grupos fundamentalistas. Nós também temos”, deda o papa. E como temos. E como os grupos, ainda que pequenos, são muitos. São os pequenos covardes, sarados e bem vestidos, que agridem atrizes nas ruas, e que vão ganhando coragem para os passos seguintes de surrar ou matar putas que defendem o que ele odeia. São os sozinhos ou em grupo que saem matando por ódio, xenofobia, ou tara. São os que fazem dinheiro sangrando guerras.
Um papa é pouco para tanto desacerto. Mas esse diz a que veio. E insiste. Hello, minha gente! Vejam bem as tragédias que estão cevando.
Isso não é pouco.