*Chico Alencar é professor de História (UFRJ), escritor e deputado federal (PSOL/RJ)
Brasileiro/as com mais de 40 anos – entre os quais me incluo, faz tempo... – têm grande apreço por eleições. A ditadura civil-militar, além da censura, prisão e tortura, tratou de restringir ao máximo o preceito liberal da escolha dos governantes e legisladores. Na época trevosa, a gente votava, escolhendo a dedo candidato dotado de altivez, sabendo que seria logo cassado. Elegíamos a bola da vez...
Nunca consideramos eleição, porém, uma varinha de condão, com poder, por si mesma, de transformar a sociedade. Mas era uma etapa importante para democratizá-la, para socializar os meios de governar. É ainda.
Domingo que vem, impressionantes 57.958 cargos de vereadores e 5.568 de prefeitos serão preenchidos pelo voto de 144.088.912 eleitoras (priorizo o feminino por serem 52% de mulheres).
Impressionante é também a má qualidade de muitas candidaturas e de seus partidos: falta-lhes espírito público, visão de poder como serviço e não para dele se servir, implementação de políticas públicas ao invés de busca de benefício patrimonial, delegação pelo voto como chamamento à permanente participação, espantando a acomodação. Os partidos, quase todos, negam o que suas siglas indicam: progressista é reacionário, trabalhista é patronal, democrático é autoritário, republicano é oligárquico. Tem até socialista que é capitalista... Todos são contra a corrupção mas quase todos a praticam!
Impressionantes são as regras eleitorais, mudadas a cada pleito, para perpetuar o condomínio do poder, restringindo o debate, a livre escolha e a igualdade de oportunidades entre os competidores nos meios de comunicação de massa.
Ainda assim, votar bem é um imperativo. Ser criterioso é examinar a história de vida do candidato, seu compromisso com o coletivo (e não com o sucesso individual), o ideário de seu partido, as coligações que fez (para não votar em flor e eleger espinho), sua postura diante da corrupção sistêmica - participação no conluio, omissão frente a ele ou efetivo combate.
Eleitor desde os anos 70 do século passado, sempre fico emocionado na cabine – antes com a cédula a ser preenchida, agora diante da máquina a ser teclada. Capricho como se estivesse batendo um pênalti em final de Copa. Sei que, ali, estou me colocando por inteiro, com minhas crenças e vontade de contribuir para que a injustiça, a desigualdade e a mentira diminuam. Confirmo e... continuo, com tantos, na luta cotidiana para fazer dessa vergonha uma Nação.