Dezembro e quase verão, vários
jornais de circulação nacional, enquanto a maior parte das notícias ainda versa
sobre os escândalos políticos nossos de cada dia, outras estamparam com alarme
a iminência de um novo surto da doença. Declarações preocupadas de autoridades,
discursos inflamados pedindo uma cura efetiva. O que
ontem era manchete, hoje já é estatística, porém.
Desde sua descoberta, que deu-se
acidentalmente durante uma pesquisa que buscava entender a propagação da varíola,
a questão Zika foi posta em quarentena- o vetor em seu local de origem preferia
outros animais que não o homem. O preço dessa omissão veio quase 80 anos
depois.
Após uma copa mal sucedida em todos
os sentidos, o Brasil decretou estado de guerra contra o vetor Aedes Aegypti-
mas ele já tinha dado as caras no país muitos gols antes. Alguns mutirões e
outros tantos folhetos depois, porém, vimos essa preocupação escoar para as
margens- e a culpa não é só do vaso que você não pôs areia.
A epidemia de Zika surge em uma
omissão- e perdura devida a uma, também. Não fosse essa a razão, não seriam os
maiores focos as periferias. Provas objetivas de descaso social, esses e outros
tantos lugares marginalizados pelo poder público, devido à evolução dos "mosquitos
malfeitores", são dotados de condições ideais: um aglomerado de alvos de
pouca pelagem (prazer, nós), próximos a água de um saneamento que não existe.
Tendemos a ser omissos quando lidamos
com algo que diretamente não nos afeta. Programas sociais são balelas se
serviços públicos não são assim tão úteis. Cotas não te representam se você não
é negro- ou se você é Fernando Holiday. A microcefalia e outras consequências
parece distante, se assim efetivamente acreditamos estar.
O problema do homem é deixar que se
façam periferias daquilo que ele acha que não tem o dever de cuidado. Quando
essa acepção particular, porém, ganha espaço no governo, lacunas sociais são
abertas- e eventualmente acabamos vendo marcar manchetes uma nova epidemia.
Seguir eliminando pequenos focos em um mundo de poças e fossas é
imprescindível, mas também é achar que com uma peneira podemos, sozinhos, tapar
o sol.
*Vânia Caires*