Toda filosofia parece pertencer às mesas de bar. Como se a
natureza humana não se importasse com o que lhe é cômodo, aprendemos a nos
inquietar somente com o que manifestamente nos desagrada. Não questionamos o
bom, tampouco o apreciamos de forma calorosa. Somos passivos – até que um
cenário mude e nos transforme. De mudos, passamos para passionais.
Ontem, o mundo recebeu a notícia de que Trump é o novo
presidente das terras do Tio Sam e a internet viu jorrar alguns milhões de
caracteres nesse sentido. Por um dia, todas as crises pareceram pequenas e toda
a leva de homens médios inflamou seus dizeres, fazendo das timelines uma verdadeira ágora. Uma passividade rompida de forma brusca pelo
inesperado.
Sem discutir o mérito do resultado, talvez a fronteira maior
para o homem, mesmo após Trump, seja seu conformismo. Não é em nada criticável
a mobilização de ontem e de todos os outros iguais dias de ápices jornalísticos
– mas viver de dar poucos passos torna lenta e cansativa a luta, postergando o
mérito de uma causa que, se soubéssemos nosso poder, já teríamos ganho há
tempo.
Toda filosofia parece pertencer às mesas de bar. E todo
interesse por política parece derivar só de grandes fatos. E enquanto a história tece seu rumo com os
pequenos atos cotidianos, estamos em berço esplêndido esperando sempre uma nova
guerra, sempre maior que a anterior, pra ostentar nossa bandeira – esquecendo
que é necessário manter sempre em mão as nossas armas.
Não fosse o resultado não querido, o dia de ontem teria sido
marcado por um outro feriado municipal. Por seu aniversário, talvez. Quem sabe?
Mas não teria o povo se inflamado e discutido o que por essência deveria ser o
seu mais recorrente discurso. Não seria o homem tirado de seu sofá mental e
posto em assembleia.
Temos até que agradecer. Não fosse o Trump, não teria o
desamor.
*Vânia Caires*