No Brasil oficial, ainda tão bacharelesco e retórico, algumas questões importantes até são mencionadas, mas geram poucas medidas práticas. A do cuidado ambiental, por exemplo, é central nos discursos e periférica nas políticas públicas. Outras raramente chegam às tribunas e palanques: são providencialmente esquecidas, ocultadas. É o caso da chaga da desigualdade social.
Semana passada, às vésperas da comemoração dos 129 anos da Abolição (parcial) da Escravatura, foi lançada em Brasília a Campanha Pela Redução da Desigualdade Social, em evento que lotou o auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados. Nenhum órgão da mídia grande registrou. E, absurdo dos absurdos, nem a TV Câmara cobriu!
A iniciativa é do Fórum Nacional Pela Redução da Desigualdade Social. Dele participam CNBB, OAB, Conselho Federal de Economia, Conselho Federal de Serviço Social, centrais sindicais como CUT, CTB, CGTB, Força Sindical, CSP/CONLUTAS e UGT. E também CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), MST, Auditoria Cidadã da Dívida, Cáritas, DIEESE e entidades de auditores fiscais, entre outras. Coalizão muito representativa, portanto (conferir em bit.ly/campanha-desigualdade e asp@cofecon.org.br).
A campanha tem cinco eixos. Eles deveriam fazer parte de qualquer proposta consequente para tirar o país do atoleiro econômico, político e ético em que se encontra: mudar o modelo tributário, preservar e ampliar os direitos sociais, priorizar as políticas públicas de valorização do trabalho e da educação, reforçar a função social do Estado e ampliar a democracia e a participação social.
Concretamente, aponta para a centralidade de uma Reforma Tributária, denunciando nosso modelo arcaico e regressivo. Por ele, 72% da arrecadação de tributos estão concentrados sobre o consumo (56%) e a renda do trabalho (16%). Já os impostos sobre o capital (lucros e dividendos) e a riqueza totalizam apenas 28%, na contramão da Europa, por exemplo, onde essa oneração representa 67% da arrecadação, com 33% sobre consumo e salários.
A pouca progressividade do Imposto de Renda entre nós também é singular (por muito injusta, a demandar mais faixas e alíquotas). Grandes fortunas e heranças são subtaxadas. Ganhos financeiros e juros sobre capital próprio não são tributados. A sonegação campeia.
Acrescentem-se a isso os gastos abusivos com juros e serviços da amortização da dívida pública, responsáveis por 80% do nosso déficit nominal, para alegria dos grandes rentistas.
As dificuldades para a implementação de políticas públicas que promovam a Justiça Social no Brasil advêm de má arrecadação e de má qualidade do gasto público. Por óbvio, só a partir de governos com programas legitimados pelo voto popular, compromisso com a moralidade pública e a participação cidadã na gestão poderemos avançar nessa direção. E, assim, colocar a redução da desigualdade social no discurso e na prática, no verbo e na verba, na intenção e na ação.