Busca-se, pela enésima vez, o modelo político-eleitoral ótimo, que idealmente será alcançado por meio de uma reforma amplamente desejada. Mais uma vez, entretanto, a montanha parirá um rato. O motivo disso seria a resistência do sistema, supostamente maligno, a mudanças supostamente benignas. É a explicação óbvia. Convém desconfiar dela.
Não é tão difícil desenhar modelos “melhores” que o atual. Mas, melhores para quem? Um problema é a dispersão de objetivos, conforme as conveniências. Quem está no governo, ou acha que vai chegar lá, quer facilitar a governabilidade. Mas só para si próprio. Além disso, os papéis flutuam conforme a conjuntura momentânea de cada ator.
Há, por exemplo, uma maneira simples de dar ao presidente eleito maioria sólida na Câmara dos Deputados. Basta combinar alguma cláusula de barreira com o seguinte dispositivo: cada partido ou coligação elegeria em cada estado uma bancada, em lista aberta ou fechada, proporcional aos votos válidos recebidos ali pelo seu candidato à Presidência.
Aliás esse mecanismo poderia ser facilmente replicado para governadores e assembleias, e para prefeitos e câmaras.
A dispersão cairia dramaticamente. Se a lista fosse fechada, o custo da eleição de deputado ou vereador iria para perto de zero. Diversos objetivos dos reformistas seriam atingidos. Haveria inclusive mais legitimidade para algum semipresidencialismo, dada a conexão direta entre o voto para o executivo e a escolha dos parlamentares que aprovariam o gabinete.
Mas nada parecido com isso será implantado. Num sistema assim, o PT e aliados próximos fariam em 2018 no mínimo 40% da Câmara. Os aparentemente fanáticos da governabilidade do governo Temer sabem fazer conta, principalmente as de chegada. A governabilidade do próximo presidente é desejável, desde que ele tenha determinada agenda.
O nó da nova reforma política tem a ver com esse detalhe. A caçada atual pelo “bom sistema” é apenas cobertura para a busca de algum mecanismo que garanta o apoio da maioria do próximo Congresso à agenda deste governo. Agenda que, infelizmente para os proponentes, não tem apoio social suficiente para passar tranquila no Legislativo. Neste ou no próximo.
Essa tensão entre o que se gostaria de aprovar no Congresso e o que é possível, dada a correlação social de forças, é o caldo de cultura de uma farta mitologia. Um mito fascinante é o da renovação. Repete-se que o problema está na dificuldade de eleger pessoas novas, e portanto (sic) boas. É o contrário. Nossa Câmara tem uma das maiores taxas de renovação do mundo, perto de 50%. Na dos EUA costuma ser de 10%.
Com o voto distrital ou misto (distrital+lista), a taxa de renovação nas eleições para o Legislativo despencaria. É só olhar pelo mundo. Mas o distrital é apresentado como a melhor alternativa pelos mesmos que insistem na premência de renovar os quadros políticos, para que os maus deem lugar aos bons. E que por isso não aceitam o distritão.
Não perca seu tempo, caro leitor, procurando racionalidade nesse debate. O problema dos nossos reformistas é que em quase qualquer sistema a vontade da maioria acaba se infiltrando em algum grau na representação política. O nó do alto custo político das reformas liberais não está nos eleitos, mas nos eleitores. E esses são mais complicados de reformar.
Sem chance de dar certo
Privatizar faz algum sentido quando é para abater dívida que custa mais do que a estatal entrega para o Tesouro. Ou para ter dinheiro para investir. Vender ativo para cobrir despesa corrente é ruim. Vendido determinado bem, a despesa continuará ali. Os mesmos empresários que pedem isso ao governo demitiriam o executivo que fizesse algo assim nas suas empresas.
O Brasil foi programado para quebrar. As despesas estão protegidas, especialmente as mais indefensáveis. Quando a receita cai, resta caçar fontes extraordinárias para fechar as contas. Se o Brasil não existisse precisaria ser inventado: o Estado quebrou nos três níveis, mas festeja-se a existência de uma lei de responsabilidade fiscal.