A máxima “malandro é malandro, e mané é mané”, não se ajusta mais aos trópicos bananeiros.
A bananidade conseguiu, também, entre tantos outros feitos, produzir um indivíduo único: o malandro-mané.
O malandro-mané, é o sujeito que se julga muito esperto e tem como lema de vida, levar vantagem: porque o certo é levar vantagem, certo? Só que ele é também - ora, veja! - um rematado mané.
Frequentou a escola por brevíssimos períodos, aprendeu a ler com dificuldade (que persiste até hoje), mas encheu-se daquilo - quem precisa de escola, não é mesmo? -, e resolveu sair por aí para pegar atalhos na vida: um amigo aqui, outro acolá, uma cachaçada numa birosca, um ovo azul noutro pé-sujo, e pronto, negócios são feitos, amizades estreitadas, e vida que segue - flanando.
O malandro-mané, encontra outros manés como ele pela vida, e vai expandindo sua rede de contatos - manés são sempre muito próximos e solidários -; vai elevando arbitrariamente os preços, obtendo facilidades aqui e ali, firmando seu monopólio; ou vai galgando altos cargos, puxando saco aqui, puxando saco acolá: o ápice da esperteza. Encontra-se, então, num belo dia, senhor supremo de um grande e produtivo feudo; suplantados os inimigos e a concorrência, acha-se no mais estável dos mundos: o mundo cor-de-rosa dos malandros-manés. E é cor-de-rosa mesmo porque os malandros-manés são naturalmente cafonas.
Ocorre que nos dias que se sucedem, a estabilidade de qualquer dos mundos, dura o exato instante necessário à transição: a realidade, nos dias que correm, é liquefeita; não se dá mais puramente em razão de necessidades concretas, antes, porém, e mais fortemente, em razão do sem-número de nuances que abriga a alma humana – a realidade, hoje, é materializada pela inconstância humana.
Mas quem poderia imaginar, não é mesmo?
Não o malandro-mané, evidentemente.
O malandro-mané, entende, no máximo, o que são dois mais dois, mas, francamente, inconstância humana? Qué isso véi?
E, como senhor absoluto de seu feudo, o malandro-mané, persiste jogando com suas cartas - o malandro-mané é expert em truco! -, até o dia em que inevitavelmente choca-se com a liquefeita realidade que já não é mais a mesma de instantes atrás: como assim?!, estava tudo certo, eu estava por cima da carne podre agora mesmo! O que houve?
O que houve é que não se constrói casa na areia, edifício no charco ou monopólio sem estratégia de longo prazo – longuíssimo prazo.
E, todavia, os manés dos trópicos são mundialmente conhecidos pelo improviso, pela gambiarra, e, manés que são, muito se orgulham disso - ou se orgulhavam: muitos, hoje, apesar de manés, começam a divisar que a liquidez do tempo e de todas as coisas, poderia estar a lhes exigir, quem sabe, um pouco mais de preparo: quem sabe um pouco mais de cultura, leitura, livros, escola ... Ah, que bobage, véi!
Pois é.
E assim é, que o estudo sistematizado do convívio dos malandros-manés com o meio circundante aponta para a abrupta queda de sua reprodução; os mais velhos, em franco processo de extinção, vão, inelutavelmente, encontrar seu fim no whatsapp: um sem-número de fotos, vídeos e gravações decretarão que perderam, manés; os mais novos, igualmente, encontrarão o fim da linha nas mesmíssimas redes sociais – mas ficarão ainda mais surpresos com a rapidez com que isto vai acontecer.
A opinião pública detesta gente besta.
A birosca ali da esquina, ou aquele pé-sujo ali, podem quem sabe, virem a representar refúgios, mas não se mostram muito promissores.
Quando um tempo passa, passa mesmo: a história vem e engole tudo e todos.
E não adianta chorar, malandro: fiado, só amanhã, mané.