O fundador de Rio Preto, João Bernardino de Seixas Ribeiro, nem em sonhos imaginou que os casebres de antanho, perdidos em meio a uma vasta vegetação, se transformaria em uma bela cidade com mais de 500 mil habitantes. Houve dois fatores importantes nos primórdios para que o município se desenvolvesse. Primeiro foi o café, que encontrou por essas plagas terras férteis para que multiplicasse em centenas de milhares o verde das folhas e o vermelho dos grãos maduros. O segundo foi a chegada dos trilhos da EFA, em 1912, que por aqui permaneceu até 1933 por força política.
As primeiras lavouras animaram os fazendeiros a plantarem mais e mais mudas. Quando se deram conta, não havia mão de obra suficiente para tanta colheita. A solução foi trazer do exterior gente para trabalhar nas lavouras. Fazendeiros construíam colônias para abrigá-los e também trabalhadores de outras regiões do país.
Os pais de Ana, italianos de Cisterna, província de Nápoles, embarcaram com destino ao Brasil, o casal e mais três filhos. A mãe estava grávida do quarto bebê. A menina nasceu em pleno Oceano Atlântico, dias antes de aportarem em Santos. De lá, vieram direto para nossa região, trabalhar em fazendas de cafes. Enfrentaram dificuldades, a começar pelo idioma. Aos poucos, foram se adaptando, os filhos em idade escolar iam para a escola e os maiores, direto para as lavouras.
Ana frequentou a escolinha rural, onde ganhou o doce apelido de italianinha. Aos 15 anos, era a menina moça mais linda das bandas de Rui Barbosa, hoje Ruilândia. Longos cabelos loiros, a tez alva e os grandes olhos azuis emolduravam a bela face. Mãos de fada, dedos longos e delicados, quando caminhava, parecia andar de mãos dadas com o vento. Tinha muitos pretendentes, mas o pai, sempre por perto, desestimulava qualquer intenção dos moços.
Enquanto, naquele dia, dançava com um primo, viu pela primeira vez Dioguinho sanfoneiro. Seus olhares se cruzaram. Foi como um raio atravessando o salão. Sentiu algo que nunca havia sentido antes. Pela primeira vez, estava enamorada e percebeu que fora correspondida. Quando o sanfoneiro pediu sua mão em casamento, aceitou de pronto. Em seis meses de namoro, se casaram. Para sua tristeza, o marido era muito ciumento, não permitia que ela fosse aos bailes em que ele tocava, e também não a deixava sair de casa. Vivia como prisioneira. Um dia, tomou a jardineira rumo à cidade. Diziam por pura maldade que fora embora com outro, o quê não era verdade. Quando soube da morte de Dioguinho, voltou. Mas já era tarde.
Sentindo-se culpada pelo ato tresloucado do marido, Ana, a italianinha enlouqueceu. Vivia atormentada perambulando pelos cafezais, cantarolando velhas canções napolitanas. Não perdeu a elegância nos gestos, a doçura na fala. Os grandes olhos azuis continuavam a iluminar aquela face outrora bela, agora cansada, na mais triste solidão.