Antonio Rocha Bonfim (Foto: Divulgação)
Marcelo Alcântara Xavier, o Max, é, indubitavelmente, um modorrento...
Antes de dar sequência ao relato, façamos um breve esclarecimento. Modorra é um substantivo feminino – creio que de origem espanhola - cujo significado é: sonolência provocada por algumas doenças. Também designa uma vontade muito grande de dormir, ainda que não provocada por doença. Por extensão, modorra também significa apatia, desânimo. Outro significado de modorra é: doença do gado ovino. Mas, deixemos de lado o último significado – que não tem qualquer relação com a história a ser narrada, ou será que tem? - e recomecemos.
O Max sempre foi muito esperto, sem vestígios de parvoíce; entretanto, um tremendo dorminhoco, sono pesadíssimo.
Marcelo Alcântara Xavier, quinze anos de idade, é, com justiça, conhecido e reconhecido na comunidade como um adolescente exemplar: estudioso e comedido. Jamais pitou, cheirou ou injetou; nunca ingeriu bebida alcoólica e nunca foi adepto de estripulias e/ou zombarias. Max sempre foi amigo de todos, mas, dentre todos, destacam-se três amigos: Senegal, Agrião e Dourado – nascidos na mesma comunidade e cujas idades são respectivamente, catorze, quinze e dezesseis anos.
O fato de ser um modorrento, digo, um dorminhoco, evidentemente nunca foi um defeito, no máximo, um problema. Max até passou por alguns exames médicos, mas nada de errado foi detectado em tais exames. Era uma pessoa que dormia, digamos, mais que as outras; afora isso, um adolescente boa-praça, excelente filho, leal com os amigos, prestativo para com todos da comunidade... Gente boa, mesmo.
Uma única vez, a mãe de Max ficou preocupada com o sono do filho, foi quando este dormiu por trinta e nove horas ininterruptas. Felizmente, Max acordou na quadragésima hora e estava com ótima disposição. Era isso: dormia acima da média, e só!
Numa sexta-feira à noite, Max, Senegal, Agrião e Dourado foram à birosca próxima, onde lancharam e tomaram refrigerantes. O quarteto deixou o estabelecimento antes das vinte e duas horas, depois de combinar um futebol para a manhã do dia seguinte.
No sábado pela manhã, Dourado, Agrião e Senegal bateram à porta da residência de Marcelo.
“Bom-dia, dona Celina”, disse o Senegal, assim que a mãe do Max abriu a porta, “combinamos uma pelada... quero dizer, marcamos um futebol para hoje, o Max está?”
“Sim, ele está”, respondeu a mãe do Max, “mas, quando chegou, ontem à noite, estudou um pouco, deitou e desmaiou, está dormindo, já tentei, mas não consigo acordá-lo.”
“Está tudo bem, dona Celina”, disse o Dourado, “podemos remarcar o futebol para amanhã.”
“Está certo”, disse dona Celina, “quando o Max acordar, digo a ele que vocês o procuraram, meninos.”
Agrião, Dourado e Senegal voltaram no domingo e... Max continuava dormindo. Retornaram na segunda-feira, terça, quarta... E Max dormindo.
Um detalhe foi omitido nessa história: pouco antes de meia-noite da sexta-feira em que os quatro amigos foram à birosca, houve um confronto entre milicianos e narcotraficantes pelo domínio do território. E quando isso ocorre – o que é frequente -, balas distraídas sempre entram por portas e/ou janelas, é praxe!