Minha crônica anterior, “Jeca Tatu”, publicada neste espaço no dia 22 de julho, recebeu de amigos leitores manifestações de carinho por e-mails, pessoalmente e nas redes sociais. Uma das leitoras, minha amiga Patricia Soares, lembrou que quando menina sua mãe lhe dava o tal biotônico com sucupira. Contou que a mãe, com toda paciência do mundo, fazia “aviãozinho” até que ela tomasse o bendito remédio.
Também difíceis de tomar eram pílulas verdes contendo óleo no interior e muito amargo. Mesmo assim, tínhamos que tomá-las em jejum para matar ascaridíase, também conhecida por lombriga ou bicha. Havia naqueles tempos uma campanha muito forte de órgãos governamentais junto ao homem da roça para acabar com vermes que consumiam com a saúde do pobre caipira.
Havia, inclusive, orientação de postos de saúde de municípios aos caboclos para que construíssem fossas sépticas no fundo dos quintais, distantes de cisternas, para que não houvesse contaminação do lençol freático. O simples fato de se construir privadas e conscientizar o matuto de que higiene evitava doenças em muito o ajudou a ter uma vida saudável.
Ações eram feitas por parte de governos para erradicar males que afetavam diretamente habitantes do campo. Entre eles, estava o bicho barbeiro. O danado atacava quando as pessoas estavam dormindo. Na escuridão, saíam de suas tocas instaladas nas frestas das paredes de taipas, para sugar do pobre caboclo o pouco sangue que ainda lhe restava. Pronto! O mal estava instalado. Infelizmente nossos bravos soldados da roça tombavam diante de um pequeno inseto.
O caipira era realmente um bravo! Além de ser explorado por patrões desalmados, ainda tinha que conviver com essas pragas que vitimaram tantos homens e mulheres desbravadores dos sertões paulista. Assim, na primeira oportunidade em que aparecia, o caboclo não hesitava em deixar a roça, não pensava duas vezes e embarcava em novas aventuras em direção à cidade.
Esse movimento de deixar a terra amada em busca de novas aventuras na cidade grande também foi descrito por Monteiro Lobato no conto “João Teodoro”.
João Teodoro era pacato, modesto, leal e, principalmente, honestíssimo. Diz Lobato que ele nunca fora nada na vida. Por muito tempo não quis nem sequer o que todos queriam: mudar-se para terra melhor. Mas João acompanhava com aperto no coração o desaparecimento da sua Itaoca.
“Isso já foi bem melhor”, dizia ele. “Já teve inclusive três médicos dos bons, agora só tem um e bem ruinzote”, emendava.
Foi então que João Teodoro começou a matutar a ideia de também deixar sua cidade. Mas precisava de um bom motivo.
Um dia, recebeu telegrama da capital dizendo que o haviam nomeado delegado. A notícia caiu como uma porretada no crânio do nosso homem. Quando autoridades viessem à cidade, era com ele o primeiro encontro. Além do mais, delegado era coisa seriíssima! Não havia cargo mais importante. É o homem que prende, solta e manda dar sovas. Que vai à capital falar com o governador. Coisa colossal, ser delegado.
Aquela noite Teodoro passou em meditação. Muito antes de a aurora desfraldar as últimas pregas de rendas da noite, ele estava de malas prontas para ir embora. Na saída, encontrou um velho amigo que estranhou a atitude do novo delegado e perguntou: “Mas, João Teodoro, aonde vai uma hora dessas com essas tralhas todas?” Ao que ele respondeu: “Uma cidade que tem João Teodoro como delegado não serve pra eu viver”.