“Moço, desejo só um minuto da sua atenção” Olho pro lado e vejo uma figura de um senhor de semblante encanecido, as mãos trêmulas de quem tanto pegou no pesado, os ombros arcados como se carregassem o mundo em suas costas. Sua fala doce e terna tinha a calma dos grandes dos lagos, seus olhos...bem. Seus olhos traziam estampado o brilho refulgente da estrela da manhã, e eles continham segredos jamais revelados. A pele de seu rosto trazia marcas profundas, verdadeiros sulcos cavados na alma e que os deixavam transparecer na pele ressecada. Quanta bondade vi passar naquele segundo em que eu o analisei sem mesmo pensar que o estava fazendo. Ele ali sentado ao meu lado num consultório médico. Digo lhe: “Pois não!” e ele com uma voz um tanto cansada pelos janeiros da vida me diz: “ Não sei porque mas sinto um desejo enorme de prosear com o senhor” disse-me ele. E eu com um leve sorriso: ”Será um prazer ouvi-lo”
“ Eu venho de tão longe no tempo que nem sei mais prá que viver. Tenho tanta saudade dos tempos idos. Lembranças de minha doce infância morando na roça e brincando à sombra dos pomares. Sinto ainda o cheiro da fruta madura que não foi colhida, o cheiro da terra molhada com os primeiros pingos d’água. O sereno da madrugada orvalhando os trieiros nas invernadas.”
Olho para ele e tento esconder uma lágrima que teima em rolar pelo rosto. E penso: “Meu Deus, quanta simpatia”. Nisso a voz da atendente se faz ecoar no recinto. Estava chamando justamente o meu nome. Olhei para aquele senhor, me despedi rapidamente. Levantei-me com um aperto no coração e com a certeza que aquele senhorzinho tinha algo a mais para me dizer além da dor da sua saudade. O que seria?