O motorista que há muito não passa pela Euclides da Cunha, ao fazê-lo, com certeza, terá grata surpresa. As obras de duplicação estão bastante aceleradas e, creio, em breve, teremos as duas faixas ligando a capital até as barrancas do rio Paraná, divisa com Mato Grosso do Sul.
Voltando no tempo, há pouco mais de 200 anos o governador Antonio Manoel de Mello Castro e Mendonça determinou que se fizessem estudos e abrissem estradas no antigo “Picadão de Cuiabá”, partindo de São Paulo em direção à “estrada da Farinha Podre,” atravessando o rio Grande na altura de São Francisco de Sales, em Minas Gerais, onde ligava Uberaba (MG) a Paranaíba (MT). Vale lembrar que nessa época Rio Preto nem existia. Tudo por aqui ainda estava por desbravar. Um mar de floresta cobria de verde a imensidão. Aos poucos, de maneira lenta e gradual, o sertão foi sendo povoado. Os primeiros a se estabelecerem por estas bandas foram os irmãos Gonçalves de Souza, isso por volta de 1820.
Na segunda metade do século 19 e início do século 20, o picadão que ligava Jaboticabal a Cuiabá, passando por Rio Preto, teve papel preponderante. Os boiadeiros que antes tinham que cruzar o rio Grande, vindos de terras mato-grossenses pela estrada da Farinha Podre em direção a Barretos, trazendo boiada para o abate no Frigorífico Anglo, agora encurtavam caminho em meio às matas, ganhavam tempo e dinheiro. O que antes era simples picada ganhou importância e virou estrada de mão dupla: por ela vinham os bois gordos e na volta, os peões levavam produtos industrializados, entre eles pólvora, querosene, medicamentos, ferramentas e, claro, cachaça.
Às margens da velha vereda, vilarejos foram erguidos. Sonhavam com a prosperidade, alguns venceram as dificuldades e hoje são belas cidades, outros não tiveram a mesma sorte e sucumbiram ante as cruezas da vida, deixando marcas indeléveis de um passado distante.
A velha estrada boiadeira, que tanto contribuiu para o progresso do sertão do oeste paulista, agoniza esquecida como trapo em um canto qualquer da vida. Descaracterizada em alguns pontos, em outros, nem existe mais. A calha sulcada pelos cascos dos animais e pela erosão formava barrancos que davam a ela encantamento e beleza. A vegetação às margens criava um grande túnel serpenteando e dando sombra aos passantes.
Se existem homens que somente pensam no progresso a qualquer custo, esquecendo a nossa história e nossas memórias, no sentindo inverso, outros pensam justamente o contrário. É o caso do jovem turismólogo e pesquisador da cidade de Votuporanga Evandro Ferreira Junior da Silva, que, com sua pouca idade, tem o olhar voltado para o passado e a grande preocupação em manter viva a memória para gerações vindouras.
Evandro é um estudioso da nossa estrada boiadeira. Com Genésio Seixas, de Jales, outro pesquisador e historiador, escreveu e está finalizando o documentário “Velha Vereda do Sertão”, com patrocínio de leis de incentivo do governo estadual. Com essa ação, estão trazendo luz sobre o nosso passado que muitos teimam em apagar.
Tive o privilégio de narrar e ser entrevistado para o documentário. Aqueles apaixonados pela causa caipira e que vivenciaram a velha estrada com certeza se emocionarão ao ver belas imagens.
Evandro e Genésio, um dia, quem sabe, possamos caminhar juntos pela velha vereda do sertão... De tantos cantos, contos e encantos!