Graziele Delgado e Evandro Valereto (Foto: Arquivo Pessoal/ A Cidade)
Olá, querido(a) leitor(a). Imagine a seguinte situação: Joice trabalha em um salão como maquiadora e tem uma técnica incrível. Praticamente não tem agenda e suas clientes precisam marcar com muita antecedência, se quiserem sentar na sua cadeira. Cansada que ganhar apenas parte dos ganhos – já que uma porcentagem fica para o salão – Joice resolve abrir seu próprio espaço e atender “por conta”. Muito responsável e “pé no chão”, ela começa com um espaço pequeno, com custos baixos e segue seu caminho. Alguns meses se passam e Joice não pode mais ser a maquiadora: ela precisa contratar, organizar, fazer a manutenção, organizar as burocracias, fazer o caixa, etc. Passam-se mais alguns meses e Joice ainda está bem longe do que imaginou quando saiu do emprego. Mas ela é uma maquiadora incrível e não sabe o que aconteceu: o que deu errado?
Essa parece uma história fictícia, mas é a realidade de grande parte dos empreendedores do Brasil: uma realidade cruel, em que grande parte dessas pessoas vivem para pagar boletos. Segundo dados do IBGE, cerca de 60% das empresas quebram em até 5 anos. E por que isso é tão comum? Porque “ser bom” NÃO BASTA: a habilidade de prestar o serviço representa apenas 50% do “sucesso”. A outra metade diz respeito à gestão: como está o caixa dessa empresa? Qual é o pró-labore desse profissional? E quanto aos custos fixos? Como está a reserva de investimentos e manutenções? E o pagamento de impostos, emissão de notas e todas as outras burocracias?
Infelizmente, muitos de nós somos levamos pela insatisfação do momento (em um trabalho que pouco agrega ou tem um retorno ruim) para nos jogar de cabeça em um negócio. A ilusão está em, justamente, ignorar que a habilidade (ou talento) da Joice não era suficiente para manter uma empresa de pé. A partir do momento que seu espaço está aberto, não basta mais ser maquiadora: Joice precisa desempenhar outras funções e desenvolver habilidades de gestão, que vão permitir não apenas a prosperidade financeira, mas a perpetuidade do negócio.
Existem dois tipos de empresas que quebram: aquelas que não vendem – e, neste caso, não existe habilidade de gestão que a salve – e aquelas que vendem, tem clientes fiéis, mas não tem inteligência na gestão dos recursos. Portanto, apesar de produto bom, cliente fiel e marketing, o dinheiro que entra não é suficiente para garantir, de forma estratégica, o sucesso da empresa. Para piorar, ter um negócio – independente de ser formal ou não – é aprender a lidar com os riscos, viver na incerteza: existem muitas variáveis fora do nosso controle. Ignorar o pouco que podemos controlar é se entregar ao risco da ruína – que os dados já comprovam realmente acontecer.
O último ponto a se comentar é que, normalmente, a forma de gestão da empresa é um reflexo da gestão pessoal: dificilmente alguém organizado em um é desorganizado no outro. Se na pessoa física não existe orçamento, reserva, gestão dos cartões de crédito, parcelas, etc., como isso vai acontecer na pessoa jurídica? “Gerir recursos” é sobre fazer boas escolhas, e essa é uma habilidade treinável e desenvolvida durante toda a vida. Não há como desconectar uma coisa da outra: no final do dia, empresas são feitas de pessoas e a má gestão vai custar caro.
Portanto, querido(a) leitor(a), cuidado (especialmente no mundo da internet e dos empreendedores de palco): ter seu próprio negócio NÃO É para todo mundo. Existem princípios e questões enraizadas que não podem ser romantizadas – existe um preço a se pagar, se quiser realmente ter “sucesso” e fechar as contas no azul. Não caia na ilusão de que ser bom em algo te faz apto a abrir uma empresa, se não quiser desenvolver as outras habilidades necessárias a isso. Abrir sua empresa nem sempre é a solução dos seus problemas e, muito menos, seu “bote salva-vidas”. Tenha uma excelente semana, querido(a) leitor(a).