Na fazenda em que eu morava, residia sozinho, na última casa da colônia, seu Custódio. Tinha pele preta, cabelos encaniçados, andar lento e curvado pelo peso dos anos. Seus pais tinham sido escravos na Bahia. Certa feita, fui conversar com ele e saber um pouco de sua vida. Disse-me que, em criança, foi morar com os pais na vila de Monte Belo, antigo vilarejo próximo a Nova Aliança, que tinha na época mais de 500 moradores, comercio prosperando. Depois de um tempo, mudaram para o bairro da Lagoa, que mais tarde trocou de nome para São Sebastião da Fartura, depois ainda para Itapirema, que, em tupi, significa: ita: pedra; pires: fogo.
A exemplo da vizinha Monte Belo, também prosperava. Era uma ilha em meio a imensos cafezais que traziam riqueza e muita fartura aos habitantes.
Na primeira década do século passado, um surto de maleita pegou todos de surpresa. Muitos habitantes perderam a vida devido à epidemia. Às pressas, mudaram-se do lugar, deixando tudo para trás.
A vila foi definhando, até não ter mais morador. Diz a história que um tal senhor Estevão deu início a outro povoado em terras da família Lucato, que viria a se chamar Nova Itapirema.
O lugarejo logo prosperou, proporcionando tranquilidade aos moradores. O medo da praga havia passado. Os antigos moradores da antiga vila regressaram.
Senhor Bento Cocenzo e dona Inês Gomes Cocenzo moravam na fazenda Barro Preto, nos arredores da vila em formação. Cultivavam café e, ao redor da casa, imenso pomar das mais variadas frutas. Nele, a passarinhada fazia festa. E foi nesse ambiente bucólico que nasceu, em 16 de agosto de 1937, José Roque Cocenzo, hoje com 86 anos. Casado com dona Azilá Neves Cocenzo, pai de Vânia, Luciana e Carolina, avô de cinco netos.
A quebra da Bolsa de Nova Yorque em 1929 fez com que o pai perdesse o gosto de ser produtor de café. Juntou economias e comprou uma máquina de beneficiar arroz em Nova Itapirema. O menino José Roque tinha na época 3 anos.
Pergunto ao amigo como foi a infância. Ele diz que foi igual a de todas as crianças das vilas em desenvolvimento. Ruas descalças e poeirentas. Ele fecha os olhos e se deixa recostar no sofá. Por instantes, fica em silêncio, como que buscando imagens no seu HD de infinitas memórias. Lembra-se de jogar bola de meia num campinho improvisado na praça da matriz, de banhar com amiguinhos de infância na lagoa de águas transparentes. Na época de mangas, de se lambuzar de doces frutos. Lembrou-se também de armar arapucas em palhadas depois da colheita do arroz e do milho. Dona Azilá entra na sala com uma bandeja de café fresquinho. Aroma delicioso invadiu o ambiente. Depois de tomar, me despeço prometendo voltar para um frango caipira com quiabo na panela de barro. Senhor José Roque prometeu que contará outras histórias da bucólica Nova Itapirema de sua infância.