Participei recentemente em Atibaia do encontro “Entre Águas e Serras”, em que mais de vinte cidades no entorno levaram, além do folclore local, suas experiências, seus modos de vida e, claro, a comida.
Tudo aconteceu no belo e bem cuidado parque da cidade. Tiveram a sensibilidade, inclusive, de que as barracas ficassem à semelhança de uma vila. Logo à entrada, fomos recebidos pelo Toninho Macedo e Diego Dionísio, dirigentes da Organização de Arte e Cultura da Abaçaí, ligada à Secretaria de Estado da Cultura, que nos levaram para tomar café da roça. Imaginem qual foi minha emoção e surpresa ao deparar com uma casa caipira nos mesmos moldes das de antigamente. Parecia que eu estava entrando na minha velha e querida casa de terra de chão batido. A beleza estava nos detalhes. Na cozinha, um forno à lenha e, sobre ele, panelas soltando vapores de fumaça que exalavam aromas os mais diversos. Todos, claro, de dar água na boca. Uma senhora, que era a própria imagem da dona Benta, despejava água quente no coador de pano, que imediatamente caía dentro do bule de “ferroagati”, transformando-se num líquido preto e forte, sobre a mariquinha. O aroma encheu todo o ambiente. O café estava pronto. Ao lado de “dona Benta”, outra senhora cuidava de uma frigideira e ao mesmo tempo preparava numa vasilha de alumínio a massa do bolinho de chuva. Com uma colher, aos poucos ela ia depositando na gordura quente o preparo e em instantes ficou pronta a iguaria que, ao final, recebeu cobertura de açúcar e canela.
A emoção marejou meus olhos quando fomos convidados a entrar na sala ao lado. No centro, uma grande mesa coberta com toalha impecavelmente branca, toda bordada à mão, com detalhes de pequenas flores em vermelho. Ao lado da mesa, cadeiras de palha de taboa chamaram minha atenção. Num canto da sala, sobre a cantoneira, a talha não foi esquecida. A boca, como sempre, coberta com toalhinha rendada. Sentados em torno da mesa, aguardávamos ansiosos o bule verde com detalhes em branco e o prato cheio de bolinho de chuva. Aqueles quitutes tinham sabor de infância! À saída, não pude deixar de ver uma “partilera” com todos os utensílios usados na cozinha e, ao lado, o tampeiro, com tampas de todos os tamanhos.
Caminhando em meio aos aromas, cores e sabores, de repente, me deparei com a barraca dos participantes de Joanópolis e a inscrição: “Casa do São Longuinho”. Meu Deus! Há quanto tempo não ouvia essa palavra? Como num passe de mágica, imediatamente voltei ao passado e me vi no campinho de terra batida jogando bola de meia com meus amiguinhos. Lembro-me que, numa tarde, durante a nossa pelada, o Neguinho, num chute forte, fez com que a bola caísse no pasto em meio ao capim “margoso”. Por mais que procurássemos, não encontrávamos nosso brinquedo. Foi então que nos lembramos de chamar por São Longuinho. Formamos um círculo e de mãos dadas entoamos em coro: “São Longuinho, São Longuinho! Ajude nóis achá a bola di meia qui nóis dá treis gritim e treis pulim”. Não demorou para que encontrássemos a bola e, claro, todos juntos agradecemos gritando ao santo.
Ao regressar de Atibaia, senti desejo de ser novamente criança e pedir a São Longuinho de volta tantas coisas que a vida me tirou. Se me atender, prometo como quando criança: “Trêis gritim e trêis pulim”.