Minha neta adora ganhar presentes e quem é que não gosta, não é mesmo? No seu aniversário, ela recebeu tudo o que desejava: boneca, patinete, bichos de pelúcia... e até um rio, no meio da festa. Eu a chamei de lado e disse: “tenho uma surpresa para você”. Levei-a até a beira do rio e disse: “Aqui está o seu presente”. Ela ficou maravilhada, pois um rio só para ela parecia ser algo grandioso demais. No Dia das Crianças, ela ganhou outros presentes: sapatos, lousa mágica, bicicleta e, para sua surpresa, também uma árvore. “Gostou?”, perguntei. “É toda sua!”. Ela ficou animada, sentou-se à sombra da mesma e ficou observando o rio que fluía devagarzinho logo abaixo. Mais tarde, como se fosse pouco, lhe dei também uma montanha apontando para um grande monte que ali se encostava. Subimos em cima e de lá ficamos observando a paisagem ao nosso redor. Com o tempo, fui lhe dando outros presentes desse tipo até que uma vez começou a perguntar por que eu fazia aquilo, pois achava esquisito que esse presente não era só dela e não poderia leva-los pra sua casa. Compreendeu também que não podia brincar da mesma forma com aqueles presentes como brincava com os seus convencionais. Expliquei-lhe que estes presentes realmente não poderiam porque o lugar deles era ali, exatamente onde estavam, sempre à disposição, à espera de quem quisesse se aproximar. Então, em um recente passeio, apontei para o sol que iluminava o horizonte e, sorrindo, lhe entreguei o maior de todos os presentes: o sol, em suas mãos. E ela, com grande sabedoria, disse: Vovó, estou aprendendo, agora, como brincar com o rio, a árvore, a montanha e com o sol também.” Ela brincava bebendo de toda aquela vida e eu fique observando e refletindo: qual é o verdadeiro valor dos presentes que recebemos? Será que sabemos apreciar aquilo que a natureza nos oferece gratuitamente? O que estamos oferecendo às nossas crianças? As telas? O virtual? E onde colocamos o mundo real? Que judiação as privar desse convívio com a natureza! Isso nos convida também a refletir sobre nossa relação com o mundo e com as dádivas da vida. Imagine a alegria de ganhar algo tão grandioso, algo que parece impossível de possuir! Como os outros brinquedos, o rio não pode ser levado, guardado ou manipulado como um simples objeto. Ele deve ser apreciado como um presente que, em sua grandeza, se oferece livremente a quem o deseja. Esse momento de percepção é um reflexo da superficialidade do desejo humano, que muitas vezes nos leva a ver as coisas de maneira limitada. O presente, ao invés de ser uma simples posse, se revela como uma experiência. Com o tempo, tenho certeza, minha neta começará a perceber que a verdadeira essência do rio, da árvore, da montanha, do sol não está em possuí-los, mas em aproveitá-los no lugar em que estão, sempre à disposição para quem deseja se conectar com o natural, real, verdadeiro. Não é possível controlá-los ou aprisioná-los, mas eles nos ensinam a viver em conexão profunda conosco mesmos. Ensinar às crianças a apreciar o mundo com um olhar além da superficialidade e efemeridade dos desejos materiais e a valorizar experiências, ao invés de bens materiais, é um ensinamento que traz mais significado à vida e ao futuro. A ideia de que a essência da natureza é acessível a todos, bastando respeito e gratidão, é particularmente poderosa em tempos em que o consumismo domina tantos aspectos da nossa sociedade. É um presente que ressoa para as gerações futuras.