A professora Joice Mara Ferreira Carlos percebeu que seus alunos tinham dificuldades (e preguiça) de ler – assim, surgiu o ‘LiteraCura’
Projeto da professora Joice Ferreira buscou despertar (ou reviver) interesse dos alunos pela literatura; professora Julia Barbieri falou sobre seus temas favoritos: sociologia, terror e serial killers (Fotos: Arquivo pessoal)
Pedro Spadoni
pedro@acidadevotuporanga.com.br
A literatura como meio de cura. Essa é a ideia do “LiteraCura”, um projeto idealizado pela professora Joice Mara Ferreira Carlos e implementado na Escola Municipal “Profº José Jabur”, de Américo de Campos, neste ano. Segundo a professora - que, na verdade, ministra aulas de física na escola – o objetivo do projeto, que se encerrou na quinta-feira (18), foi despertar (ou reviver) o interesse dos alunos pela leitura e literatura. E ela conseguiu o que queria.
Em entrevista ao jornal
A Cidade, a professora Joice falou sobre como surgiu a ideia do projeto, as atividades que foram realizadas na escola, a adesão dos alunos e um balanço sobre essa primeira edição.
A ideia
Sempre que a professora passava exercícios de física que traziam enunciados para serem lidos e interpretados, seus alunos reclamavam – em partes, porque tinham dificuldade em interpretar as informações para resolver os problemas, mas também por preguiça de ler. Foi assim que a professora percebeu o desfalque relacionado à leitura que existia nas turmas. E foi assim, também, que a ideia do “LiteraCura” começou a surgir em sua mente, em meados de maio.
“Quando dou exercícios de física, os alunos preferem as atividades que só tem cálculos, porque é só substituir os valores nas fórmulas. Teoricamente, não tem muito o que pensar. Já os exercícios que tem teoria, eles têm preguiça de ler, dificuldade para interpretar, quando veem o tamanho do enunciado já falam que não vão conseguir entender. Senti muita dificuldade deles nesse sentido, de ter como apoio a parte da leitura. Eu também pensava sobre usar a leitura e literatura como meio de cura para ignorância e falta de informação. Então, fiz um apanhado disso”, contou Joice.
A professora também explicou que o objetivo principal do projeto pode ser dividido em duas partes: despertar (ou renovar) o interesse dos alunos por literatura e por voltar a frequentar a escola presencialmente. Isso porque quando as atividades do projeto começaram, no dia 2 de setembro, a presença dos alunos ainda não era obrigatória. E muitos que poderiam voltar a frequentar o espaço escolar não faziam isso porque, segundo ela, a escola tinha deixado de ser um lugar interessante.
“Como eles ficaram quase dois anos longe da escola, isso [trazê-los de volta] estava muito difícil. Então, eu tentei juntar uma coisa à outra para trazê-los para esse mundo, tanto o literário quanto das aulas. As atividades, como eram diferentes, chamavam a atenção deles”, disse a professora.
Programação
De setembro até quinta-feira, os alunos puderam acompanhar e participar de diversas atividades promovidas pelo projeto. Sua abertura contou com uma palestra sobre leitura, literatura e curiosidades sobre os universos da literatura e da música, bem como brincadeiras relacionadas a livros e canções.
Em seguida, os alunos participaram de uma gincana musical, com brincadeiras referentes a canções, estilos musicais, cantores atuais e das antigas. No “cinema literário”, os estudantes participaram de uma votação para escolher algum filme – baseado em livro, claro – para assistir. O vencedor foi “No Coração do Mar”, baseado no clássico da literatura “Moby Dick”, de Herman Melville.
Os alunos puderam acompanhar, também, “conexões literárias” (em que interagiram, de forma remota, com autores de livros) e “tendas literárias” (em que professores da escola e da comunidade foram convidados para falarem sobre temas relacionados à literatura). A professora de matemática Julia Beatriz Giaccheto Barbieri, por exemplo, aproveitou a oportunidade para falar sobre os seus assuntos favoritos na literatura: sociologia, terror e casos reais de serial killers e assassinos.
O projeto também organizou concursos voltados para o tema. Foram duas categorias: pose literária (os estudantes tinham que tirar uma foto com algum livro) e argumentação literária (eles escolheram um livro e gravaram um vídeo tentando convencer o espectador a lê-lo).
Um quinteto musical, acompanhado pelo professor Natanael dos Santos, também passou pela escola. Eles ministraram uma palestra – que, segundo a professora Joice, pareceu um show – sobre a trajetória dos africanos no território brasileiro e outras questões relacionadas à comunidade de negros no país.
“[A adesão dos alunos] foi bem acima das minhas expectativas. Esse projeto impulsionou os alunos a voltarem para a escola. Depois de começar, em questão de 15 dias, a presença dos alunos subiu de 60% para mais de 95%. Muitos alunos me falaram que começaram a ver a leitura de outro jeito. Achei tudo isso muito tocante da parte deles. Consegui o que eu queria”, contou a professora.