E tem gente que ainda acha que pode bater o pé e sapatear na cara do povo; ou na cara do outro - qualquer outro. Na verdade, tem gente, ainda, que acha que pode sapatear.
O que espanta, realmente, não é o assombroso avanço da tecnologia e das redes sociais - o que realmente espanta é haver gente que ainda não se deu conta disso: de que ninguém esconde mais nada de ninguém e ninguém impõe mais nada a ninguém que não seja extremamente justo e palatável - na verdade, ninguém impõe mais nada a ninguém: ou a coisa é aceita ou não, e ponto final, véi. Caiu nas redes, véi, ponto final.
Até a ditadura, hoje, é democraticamente decidida: as pessoas gritam: queremos ditadura! E ponto.
Assombroso, mesmo, é alguém vestir terno e gravata, investir-se ou ser investido em algum cargo e sair por aí arrotando autoridade! Como se o cargo lhe atribuísse autoridade e ponto final – e daí todo aquele desfile infindável de crises de poder conhecidíssimos: a criatura achando que manda e desmanda e que pode fazer o que bem entender, em razão do cargo!
Não é mais o cargo, não, caro funcionário!
É a eficiência. É a competência: são os resultados – e muita, muita, mas muita mesmo, deferência ao patrão: o povo.
Sem resultados, sem aprovação, acabou, véi. Pegue seu banquinho e saia.
Não há, hoje, no mundo, em esfera nenhuma de poder: do tio da escola, ao sumo presidente ou rei da suma potência, que se mantenha no cargo se não mostrar resultados, e com muita, muita, muitíssima elegância, educação, finesse: e muito, muito respeito ao outro - qualquer outro.
Até o lixo, hoje, recebe tratamento diferenciado; recebe deferência.
Daí que tanto faz, dois engravatados em Brasília, três ou quatro funcionários em algum gabinete por aqui, ou cinco ou seis caminhoneiros no whatsapp: o poder é o mesmo – o poder está onde está a vontade de fazer acontecer e que conta com a aprovação dos demais. E ponto final.
E não vem, não, com conversa mole, véi: ou dá o que se pede ou não tem acordo, não - vamo pro pau, mesmo: o mundo inteiro está de saco cheio, mas no caso do Brasil, tá na Lua! Na Lua!
O negócio é o seguinte, e é muito simples: acabaram as barreiras, as ficções de barreiras sociais não existem mais; é que o mundo sempre viveu e se desenvolveu na base de estórias contadas, e, hoje, é profusão de estórias que não acaba mais, todo mundo conta a sua e acredita na qual quiser. E ponto final.
Não é mais de cima pra baixo, não.
Não, hoje. Não aqui. E não agora.
O Estado, e o estado de coisas, é a gente que cria.
Uma ficção, como outra qualquer, da qual uma hora você cansa, e muda o canal.
E quando você muda o canal, muda o roteiro, véi.
Pode reparar.