Só é possível falar em sucesso da Operação Lava-jato, quer do ponto de vista da revelação de importantes fatos sobre o funcionamento da República, quer do ponto de vista da recuperação de vultosas somas desviadas em razão seu pilar jurídico, ou seja, da existência das leis 12.850/13, que autoriza os acordos de delação premiada e 12.846/13, a Lei Anticorrupção, que autoriza os acordos de leniência.
Em quatro anos, a conjugação das normas trouxe de concreto mais de mil procedimentos investigatórios contra pessoas, com e sem foro privilegiado, e um ressarcimento bilionário ao erário público lesado. A lógica por trás desse resultado é bem simples: são oferecidos benefícios jurídicos para pessoas que decidam por abandonar a prática criminosa, entregar o esquema e reparar os males causados.
Nessa perspectiva, a Petrobras, origem da Lava-jato, será de alguma maneira ressarcida dos prejuízos que seus ex-dirigentes causaram mancomunados com prestadores de serviços. Isso porque desde 2015, o Governo Federal regulamentou a Lei Anticorrupção em seu âmbito abrindo espaço para a celebração de acordos de leniência.
Os acordos de leniência celebrados somam bilhões de reais em ressarcimento e abrangem, inclusive, atos de corrupção praticados no âmbito estadual, a exemplo da corrupção praticada no governo do Rio de Janeiro. O problema é que o Estado regulamentou a Lei Anticorrupção somente na última sexta-feira (Decreto nº 46.366) e ficou de fora da indenização.
A espera, contudo, não foi recompensada. O Decreto fluminense nada mais fez do que reproduzir o texto da regulamentação federal, sem promover nenhum tipo de aperfeiçoamento, e remeter à recém-criada Controladoria-Geral as esperanças de que o combate à corrupção no estado irá funcionar.
No Decreto se observa a falta de ousadia do Governo em avançar em temas como o estabelecimento de critérios objetivos para identificação de programas de integridade em consórcios empresariais, a possibilidade de facilitar o pagamento da penalidade de multa pelas empresas ou ainda em centralizar a competência para apuração de infrações na Controladoria, minimizando o risco de retaliação política.
Por outro lado, vimos o Decreto avançar em um terreno perigoso e ilegal, que é a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica pela administração pública sem o necessário pronunciamento judicial, hipótese não claramente admitida pela Lei Anticorrupção.
O retardo do Estado em promulgar a regulamentação somente poderia ser justificado caso a sociedade civil houvesse sido incluída neste debate para auxiliar na elaboração da regulamentação. No entanto, os fluminenses serão chamados ao debate, na medida em que o PL 4207/18 de autoria do Deputado André Lazaroni (MDB), com a participação da OAB/RJ e do TCE avançar no legislativo estadual.
No PL também são contemplados outros avanços como a possibilidade de recurso da condenação à autoridade hierárquica superior, bem com a mitigado riscos na celebração de acordos de leniência, com o envolvimento do TCE nas negociações.
Antes do Rio de Janeiro, 15 outros Estados regulamentaram a Lei Anticorrupção, mas seus textos basicamente reproduzem o Decreto Federal, mostrando pouco em termos de avanço legal e a falta de participação da sociedade civil no debate.