Hoje, 3 de fevereiro, a igreja católica celebra o Dia de São Brás, o santo dos sufocados, com a benção das gargantas. O saudoso articulista da Folha de S. Paulo, Carlos Heitor Cony, escreveu sobre a data, numa crônica com o título de “O Senhor dos Sufocados” que nos remete ao passado. Vale a pena rever.
“Como aconteceu em ouros anos, ia esquecendo de celebrar o “Dia de São Brás”, transcorrido neste 3 de fevereiro. Bispo é mártir, nem sei porque ele é o protetor de nossas gargantas, de nossas tosses e sufocações.
Já lembrei, também, que em outros tempos, o que havia de gente engasgada não era mole. Espinha de peixes, ossos de galinha, caroços de frutas, às vezes nem precisava tal e tanto, bastava o simples ar – e alguém se levantava da mesa, roxo, apoplético, a mão no pescoço, querendo respirar o ar de Deus que lhe faltava.
Era de praxe, então, invocar são Brás. Mas não bastava a pia invocação. Era necessário que um coadjuvante atuasse adrede, dando uma porrada de baixo para cima dos pulmões do sufocado, ao mesmo tempo em que gritava “são Brás, são Brás”.
Na nossa rua- já lembrei isso também – havia um espanhol especializado na arte de dar porrada no pulmão alheio. Ele nem precisava apelar para o santo, pois era ateu e anarquista, fugido da Guerra Civil Espanhola, matara um bispo em Segóvia. Não lembro o nome dele, lembro apenas que tinha o apelido de Arranca – diziam que arrancava com as mãos os trilhos de uma estrada -de –ferro em Catalunha.
De maneira que durante algum tempo duvidei se a eficácia de são Brás era devida a ele ou à mão ímpia e cabeluda que arrancava trilhos fincados em dormentes com grampos de aço.
Hoje, voltei a acreditar em São Brás. Não por acaso, os grandes gigantes industriais brasileiros terminam ou terminavam em “brás” (Eletrobrás, Petrobrás, Telebrás, etc).
Vivíamos ou vivemos ainda sufocados com ossos de galinha do subdesenvolvimento, as espinhas de peixe de nossas balanças de pagamento. Era natural que, consciente ou inconscientemente, apelássemos para o santo. Mas sempre nos ficou faltando a mão decisiva do Arranca.”