Moradores de São José do Rio Preto (SP) viajaram para Kiev, mesmo com restrições em voos, para ver a filha gerada em uma barriga de aluguel
(Foto: Reprodução/G1/Arquivo Pessoal)(
Para realizar o sonho de serem pais, a administradora Camila Pavan, de 32 anos, e o fisioterapeuta Adriano Simões Garbelini, de 36, tiveram que cruzar o oceano Atlântico e enfrentar a pandemia do coronavírus para poder abraçar a filha pela primeira vez, que foi gerada por barriga de aluguel em Kiev, na Ucrânia.
Ao G1, o casal, que é de Rio Preto (SP), contou que a decisão de terem um filho por barriga de aluguel e ainda na Europa foi após Camila ter o diagnóstico de distrofia muscular.
“Ela [distrofia] impede que tenha gestação tranquila e não posso carregar o peso da barriga. Então, minha solução foi fazer a neném em outra barriga. Tentei a barriga solidária, mas não deu certo com a minha cunhada porque a gestação foi para trompa”, afirma Camila.
Longe de tabu, o método de barriga de aluguel foi, então, escolhido com tranquilidade pelo casal. Camila diz que pesquisou em vários países onde é permitido, como nos Estados Unidos, Índia, Tailândia.
“Depois que comecei a procurar várias clínicas achei a da Kiev, na Ucrânia, e ela tem um representante no Brasil. Entrei em contato, me passaram casais que já tinham feito. Não tinha nenhum conhecido e falamos por telefone Ficamos com muito medo, mas fomos com a cara e a coragem”, diz Camila.
Assim, com tudo decidido, o casal foi para Kiev fazer a coleta do material genético do marido. Segundo a administradora, por causa da distrofia muscular, ela não pôde doar o óvulo. Assim, o embrião foi colocado em uma mulher escolhida por Camila.
“Até os 25 anos eu tinha um diagnóstico errado e falavam que poderia ter filhos com meus óvulos, mas isso não era verdade, descobrimos o real diagnóstico e vi que precisaria pegar um óvulo doado”, diz.
De acordo com Camila, a primeira tentativa não deu certo, sendo apenas na segunda tentativa a gestação que funcionou. "A escolha de barriga de aluguel deixei por conta da clínica. Só pedi para que fosse uma pessoa responsável e saudável
Gestação e pandemia
Camila e Adriano, mesmo no Brasil, acompanharam os ultrassons, as informações das medidas do feto e fotos que vinham da clínica de Kiev.
A data do nascimento estava marcada, sendo 11 de junho. Mas o sonho do casal de ter a filha nos braços ganhou um contratempo. O coronavírus mudou o mundo e fechou fronteiras, dificultando as viagens, o que fez com que começasse uma batalha para ter a filha nos braços.
“Por causa da Covid tivemos muita dificuldade para chegar na Ucrânia. Pedimos autorização para o governo ucraniano e essa autorização chegou apenas três horas para o nosso voo. Imprimimos a autorização no aeroporto de Guarulhos”, afirma.
O voo de Camila e Adriano passaria ainda pela Holanda e Alemanha, antes de chegar a Kiev, o que fez com que o casal pensasse que não chegaria ao destino.
“Faltava a carta da Polícia Federal da Alemanha autorizando a gente entrar no país. Cheguei e falaram que não poderíamos embarcar. Faltavam 40 minutos para embarcar, mas esperei até o último minuto, quando me chamaram e falaram que está liberado”, diz.
Realização de um sonho
Segundo Camila, quando chegaram na Ucrânia, ela e o marido ficaram em um hotel designado pelo governo para fazer a quarentena. Após 7 dias, eles fizeram o teste, que deu negativo para a Covid-19.
Alguns dias depois, o casal conseguiu a autorização do governo para finalizar a quarentena em um hotel disponibilizado pela clínica que foi a responsável pela gestação.
“Quando chegamos ao hotel da clínica, eu estava rezando e falando para minha filha que ela poderia nascer, que a mamãe já estava pronta para ir, livre do coronavírus. Três horas depois ela nasceu”, diz.
A pequena Pietra Pavan Garbelini nasceu no dia 11 de junho, mas o casal pôde buscar a filha dois dias depois do nascimento. Mesmo não sendo comum, Camila conheceu a mulher que gerou a filha por nove meses.
“Conhecemos a nossa filha e foi emocionante. Conhecemos também a mulher e fizemos questão de conhecer para agradecer. Levamos presentes do Brasil. Muitas vezes a mulher não segura o neném da barriga de aluguel, mas fiz questão de deixar ela pegar no colo e foi um momento lindo”, diz.
Camila diz que toda a gestação da Pietra foi tranquila, mas que o coronavírus acabou virando o mundo de ponta cabeça.
“Quando percebi que teria a chance de não estar aqui quando ela nascesse, fiquei desesperada. Minha filha já não passou os nove meses dentro da minha barriga, ela passou na barriga de outra pessoa, e não queria perder mais um minuto longe dela", diz.
"Foi muito exaustivo, fisicamente e psicologicamente. Nunca passamos por uma pandemia e não sabíamos o que encontrar porque cada país estava reagindo de um jeito”, ressalta.
Camila afirma que a viagem teve uma mistura de coragem, luta e dificuldade, mas que tudo isso se tornou pequeno quando ela pegou a filha no colo pela primeira vez.
“Poderia bater de cara em um país e voltar para casa. Saí de Rio Preto só com minha fé. Não tinha um documento de liberação. Faria 10 vezes se fosse necessário. Se precisasse dar volta ao mundo 10 vezes com coronavírus para ficar com ela, eu faria”, afirma.
“Muitos me falaram para esperar isso passar, que a clínica iria cuidar tão bem, mas isso estava fora de cogitação. Eu não sou uma mãe diferente, eu sou uma mãe. Nenhuma mãe quer ficar longe do filho quando ele nasce”.
Agora, com a filha nos braços, o casal começa outra batalha, que é a de retornar para o Brasil. Para conseguir a liberação, é preciso fazer toda a documentação da Pietra para regressar ao país.
“Não temos data para voltar, precisamos tirar a documentação, fizemos um teste de DNA do meu marido com a Pietra, para provar que é filha dela. Na certidão vem como eu sendo a mãe e o Adriano como pai, e depois tiramos o passaporte para voltar”, afirma.
*G1