"Fui o único a receber João Gonçalves Leite depois que o povo o expulsou", diz Abílio Fabiano
Cibeli Moretti
Nascido na cidade de Cândido Rodrigues, Abílio José Fabiano, 85 anos, se considera um votuporanguense nato. Votuporanga, na década de 50, foi a cidade que ele escolheu para trabalhar e constituir família. Casado desde 1951 com Maria Helena de Camargo Guerra Fabiano, teve três filhos e reside aqui até hoje. "Quando eu era jovem sonhava em ser jogador de futebol, mas a profissão não era bem vista na época, e como queria me casar com Maria Helena decidi abandonar os campos e procurar um emprego convencional", conta.
Mesmo decidido a deixar a carreira de jogador, quando chegou em Votuporanga foi convidado para jogar no VEC (Votuporanga Esporte Clube), no tempo do José Silva Melo. "Jogando no VEC conseguiram um emprego para mim no Banco Paulista do Comércio, onde fiquei por muitos anos".
Mas como a vida não é só trabalho, Abílio também se lembra dos pontos de encontro dos jovens, como os bares Marabá, do Paulinho Ferreira de Oliveira, e o bar Paramount, do senhor Manoel Mata.
Política
Participativo entre os políticos, Abílio Fabiano conta que Votuporanga passou por uma fase agitada na política durante os anos 50. "A briga política era forte. Me lembro, naquela época com 25 anos, que a política era ferrenha, tendo como principais líderes o ex-prefeito João Gonçalves Leite de um lado e de outro o Capitão Leônidas Pereira de Almeida, Joaquim Franco Garcia, Otávio Viscardi e outros.
"Nas eleições daquele ano, João Leite apoiou Antônio Mastrocola, que perdeu a eleição. Daí 4 anos João Leite voltou a disputar e ganhou. Aquela foi a época mais brava e difícil de Votuporanga. Surgiu uma manifestação do pessoal adversário do João Leite que o acusava de corrupção. Acho que não era ele, eram funcionários que trabalhavam com ele. Foi destituído da Prefeitura e o Viscardi, que era vice, assumiu.
Com fortes acusações da oposição, João Gonçalves Leite foi expulso da cidade sob o apelo de protestantes. Poucos dias depois veio o boato de que João Leite tomaria posse outra vez e ele voltou para Votuporanga. Naquele tempo a companhia aérea Real tinha uma linha que pousava aqui. Eles faziam a linha aérea São Paulo - Lins - Rio Preto - Votuporanga. Com o aviso de que Leite voltaria, a rua Amazonas, na altura da Praça dos Expedicionários, ficou cheia de manifestantes, que queriam impedir que ele voltasse à Prefeitura. Policiais tentaram controlar o tumulto", lembra. Histórias da época em que a Prefeitura ficava onde é hoje a Praça dos Expedicionários (Concha Acústica). O lugar era conhecido como Largo das Palmeiras. Abílio sempre foi do lado do Capitão Almeida, do advogado Joaquim Franco Garcia, que por sinal foi padrinho de casamento dele. "Eu achei desaforo, ninguém ir receber o João Leite no aeroporto. Nem a família dele foi lá, com medo dos manifestantes, talvez. O povo estava muito bravo e irritado. Eu peguei meu carro, fui até o aeroporto e o sr. João desceu sozinho do avião. Coloquei-o no meu carro e o levei para a casa dele. Quando chequei na praça as pessoas queriam me matar", conta, rindo das lembranças.
"No outro dia cedo o Viscardi estava sentado na cadeira de prefeito e o João Leite
chegou lá, bateu o pé e falou: "o que você está fazendo aí, o prefeito aqui sou eu. E
assumiu cargo outra vez. Mais tarde ele seria deposto novamente, mas ainda ficou no comando mais uns dois meses", relembra.
Progresso
"Quem colocou os primeiros encanamentos de água e esgoto na rua Amazonas foi o Capitão Almeida. Ele foi o primeiro prefeito a pensar no desenvolvimento de Votuporanga. Com ruas de terra, a cidade era pacata, mas tinha uns valentões como o conhecido "soco inglês" e o "mão de ferro". O soco dele tinha fama de matar", brinca.
"Carros quase não existiam na cidade, me lembro de dois, do senhor Ernesto Lopes e do Álvaro Matos, dono da Casa Matos. Naquela época, quando chovia, não dava para ficar na rua Amazonas, era puro barro. O asfalto só chegou em 1960, no mandato do prefeito Nabuco.
Abílio conta também que as quermesses eram muito tradicionais na cidade. "Naquela época vinha para cá a Orquestra de Jaboticabal, a Sul-América. Muito conhecida. Em uma das quermesses, colocaram um tijolo para leilão e o sr. Hilário Sestini, dono da Ford na época e um dos fundadores da cidade, arrematou o tijolo por 5 mil contos de réis. Valor extraordinário na época. Com o dinheiro compraram mais tijolos para a construção da Igreja Matriz. No começo dos anos 60 o progresso começou a chegar, a cidade começou a receber os imigrantes japoneses que investiram na cultura do algodão. Com ele instalaram-se na cidade as algodoeiras Matarazzo, Anderson Clayton e a Sanbra".