O foco nas criança atinge seu auge por volta do século XV. Até a idade média, a
infância não era valorizada. Quando desmamada, lá pelos três ou quatro anos de
idade, a criança passava a viver no mundo adulto. Não havia escolas formais e a
família não era nuclear como agora. Na mesma casa conviviam pessoas de várias
procedências.
Na idade moderna, junto com as grandes invenções, a revolução liberal e, mais tarde, com o iluminismo e a formação da burguesia, surge a infância. A criança passa a ser mais cuidada e os laços familiares se fortalecem. Pais e filhos usufruem maior proximidade e a criança passa a ser vista como um indivíduo que precisa de atenção e formação essenciais. A infância passa a se constituir como uma idéia de momento especial, uma idade de ouro. Logo se começava a perceber que valia a pena investir nesse seres tão pequenos e dependentes.
A infância surge no momento em que se decide deixar as crianças irem à escola,
brincarem e serem crianças. Com a modernidade, a infância passa a ser mais estudada e vista como a época de formação. A criança, teoricamente, passa a ser preservada de qualquer exigência de trabalho e a ela é conferido o direito de ser criança, não tendo qualquer outro compromisso senão gozar da plenitude da sua idade. Liliana Sulzbach (2000) em seu curta-metragem A invenção da infância retrata de uma maneira objetiva e profunda os conceitos de trabalho infantil, comparando as exigências em classes mais pobres e nas classes médias altas. As diferenças são cruciais, mas em ambas acompanhamos uma espécie de corte e de invasão nos territórios do mundo infantil. Crianças assumem funções inapropriadas à sua idade.
Uma criança do interior pobre do nordeste suspira ao dizer: "que jeito tem? Tem que trabalhar...". Enquanto a menina de classe media alta fala com um misto de satisfação e dúvida: "tenho hora para tudo! Tenho vida de adulto, mas é melhor assim!", referindo-se à sua agenda lotada e, por vezes, pouco construída com base no seu desejo ou perfil, tal como o menino que suspira pela falta de alternativa e diz "tem que trabalhar!".
Almejar para os nossos filhos o melhor dos mundos é perfeitamente compreensível, entretanto o objetivo que subjaz as práticas são questionáveis. Entendemos que a formação atenda às expectativas para que a criança torne-se um adulto ?preparado? para o mundo competitivo, mas para tanto há uma espécie de inversão. Ser criança não necessariamente é ter infância e assim criamos para nossos filhos uma vida que pouco se diferencia daquela levada por nós adultos: horários rígidos, grande
quantidade de atividades esportivas, aprendizado de língua estrangeiras, fonoaudiólogas, psicólogas, pedagogas etc. Uma verdadeira equipe multidisciplinar que poucos adultos têm.